A Paz é o Caminho – Uma Rede da Cultura de Paz em construção

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A Paz é o Caminho

Uma Rede da cultura de Paz

em construção

Acolhendo

Este modesto caderno surgiu da necessidade de oferecer subsídios às reflexões e atividades desenvolvidas com o Juruá – Núcleo de Sustentação da Bandeira da Paz no Parque da Água Branca e parte do programa de ação cultural que a Abaçaí Cultura e Arte ali mantém.

São jovens e adolescentes que estão se iniciando no exercício da Cultura de Paz, e que, com seus exemplos, vêm se transformando em multiplicadores de uma nova forma de convivência entre os seres humanos.

Visa também dar uma contribuição, modesta e apoiada numa abordagem transdisciplinar e complexa, para a “construção” deste conceito ainda um tanto volátil, inspirando-se nas experiências e contribuições de tantos que, preocupados com o assunto, e por acreditarem que algo precisa, pode e deve ser feito, dedicaram e dedicam presentemente partes preciosas de suas vidas e de suas energias para ajudar na construção de um mundo mais solidário, mais justo, melhor, apoiado, essencialmente, no reconhecimento do outro como um outro, no respeito mútuo em harmonia com o meio que nos possibilita. Convivência respeitosa fundada no amor incondicional.

Que possa então, além de ser útil aos “meus juruás”, somar-se a tantas iniciativas que tenham como foco a Cultura de Paz.

Toninho Macedo

Um Programa da Unesco

1 – Conceitos e históricos

A Paz é o caminho

Rede da Bandeira da Paz

 (A paz está em nossas mãos!)

A Paz pede parceiros!

 

“Nós devemos ser a mudança que desejamos ver no mundo”.

                                                                                   Mahatma Gandhi

O movimento da Bandeira da Paz, no Parque da Água Branca, “nasceu” no aniversário da Cidade de São Paulo, 25 de Janeiro de 2000, durante a realização, pelo segundo ano consecutivo, do movimento Upa, São Paulo!

De sua “gestação”, fazem parte os vários encontros mantidos, no final de 1999, com segmentos comprometidos com os ideais de inter-religiosidade, que tiveram início na Casa da Reconciliação e desaguaram na Associação Palas Athena e no estreitamento de relações com a URI.

O momento mostrou que “era possível”, como prevê o lema da URI, e a Abaçaí Cultura e Arte fez o chamamento. Em parceria com a Associação Palas Atena, a URI e com a cumplicidade na véspera, foi organizada uma Vigília Cívico, Ecumênica e Cultural pela Paz, com atividades programadas para a noite até à madrugada (apresentações artísticas, alternadas com reflexões, exibições de vídeos, atividades integrativas, descansos), seguido, ao amanhecer do dia 25, de alvorada e o “plantio ” da 1ª Bandeira de Paz permanentemente desfraldada, e um grande abraço simbólico em São Paulo.

O movimento da Bandeira da Paz encampou os ideais do Movimento Upa, São Paulo!, seu antecedente ,visando envolver o maior número possível de segmentos da sociedade, organizações sociais e setores públicos em um grande caudal, otimizando-se as ações isoladas afim de que, em seu conjunto:-

  • Alimentem uma mobilização permanente pela vida
  • Estimulem o exercício quotidiano da cidadania;
  • Propiciem, no dia a dia, o incentivo dos valores de solidariedade, companheirismo e tolerância, humanizando-se, assim, pouco a pouco, nossa cidade;
  • Contribuam para colocar em evidência as várias ações de cidadania que permeiam o dia a dia do paulistano, em especial aquelas da sociedade civil organizada que resultam em ações consolidadas, propiciando o fortalecimento e a difusão das mesmas;
  • Sirvam de estímulo a que, paralelamente ao reconhecimento dos problemas de nossa cidade, cada cidadão se disponha a fazer a sua parte, ainda que modesta (a exemplo daquele passarinho da fábula que, cumprindo sua parte, buscava apagar o incêndio na floresta em que morava, mergulhando no riacho e aspergindo o fogo com a água que retinha em suas asas), é o despertar do cidadão e o exercício da cidadania em seu sentido essencial;
  • Incentivem a que se descubram e sejam colocados em evidência valores próprios de nossa cidade. São Paulo não tem praias, não tem morros. Mas sem dúvida a 3ª. maior cidade do mundo deve ter seus encantos. Que sejam estimuladas outras “leituras” que possibilitem a identificação de pontos mais positivos da mesma contribuindo-se para demolir a peja de “cidade mais cinza do Brasil”;
  • Contribuam para aumentar a auto estima dos cidadãos paulistanos e o apreço dos mesmos para com sua cidade. (Só se ama aquilo que se conhece);
  • Estimulem, por várias estratégias, que cada cidadão e o maior número possível de organizações sociais, adotem e se apropriem do Movimento Upa, São Paulo!, materializando-o em ações e atitudes que se multipliquem no dia a dia.

Guardiães da Bandeira da Paz

  A Bandeira da Paz permanentemente desfraldada no Parque da Água Branca, foi a primeira plantada no Brasil, passando a ser o epicentro do movimento da Bandeira da Paz, visando envolver o maior número possível de segmentos da sociedade, com a cumplicidade de artistas, representantes de segmentos da sociedade organizada, os cidadãos comuns e setores públicos em um grande caudal, buscando-se otimizar as ações isoladas .  

Para ser plantada é preciso que no local pretendido haja um “núcleo de sustentação” integrado por pessoas de qualquer faixa etária (Que passarão a ser chamados de guardiães), que deverão diuturnamente estar mobilizados, articulados, através do estudo e da promoção de atividades que ajudem, na sua continuidade programática, a construir a paz.

A bandeira do Parque da Água Branca tem como guardiães:

  • Abaçaí Cultura e Arte – Juruá ( Um programa de Ação Cultural)
  • Associação Palas Athena – Programa A Paz pede parceiros
  • Budismo Tibetano
  • Casa de Toya Jarina
  • Comitê Paulista para a Década de Cultura de Paz- Um programa da UNESCO
  • Colégio Tradição de Magia Divina
  • Colégio Magno de Umbanda.
  • Comunidade Baha’i
  • Comunidade filhos do Cacique
  • Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo/Comissão Afro
  • Entidade Espiritualista Unisóis
  • Fundação Cultural Cassiano Ricardo
  • Igreja Presbiteriana Independente
  • Informativo Tambor
  • Instituto Nokhooja
  • Intecab – Instituto Nacional da Tradição e Cultura Afro-Brasileira
  • Legião da Boa Vontade
  • Missionários Xaverianos
  • Mosteiro de São Bento de São Paulo
  • Ordem Sufi Halveti Al Jerrahi (Islâmicos)
  • Organização Brahma Kumaris
  • Souesp – Superior Órgão de Umbanda do Estado de São Paulo
  • Ramakrishna Vedanta
  • Revista Diálogo / Paulinas
  • Revista Sem Fronteiras
  • União de Tendas de Umbanda e Candomblé do Brasil
  • URI – Iniciativa das Religiões Unidas
  • Zen Budismo

– A partir da ação inicial no Parque da Água Branca, outras estão, e estarão sempre, desdobrando- se / multiplicando-se em rede, inicialmente na Cidade de São Paulo, dando origem a outros núcleos difusores com outros guardiães.

  • A Bandeira da Paz, por seu ineditismo não possui cerimonial consagrado. Por isso, à medida que avançamos, temos, com várias contribuições, buscando estabelecer alguns princípios, sempre referendados pelo Comitê Paulista para a Década de cultura de Paz. Para o seu

 “hasteamento” em espaços públicos e em caráter oficial temos levado em consideração os seguintes princípios:

. Colocando-se de frente para o conjunto de mastros, o central é sempre o principal e destinado à Bandeira Nacional. A sua direita estará a segunda em importância, seguindo-se à direita desta o espaço reservado para a Bandeira da Paz.

. HasteamentoTemos priorizado o conceito de “plantio” a hasteamento, para a ação inicial, indicando, assim, que, tal qual com os organismos vivos, os guardiães assinam um compromisso de zelo permanente.

. Permanentemente desfraldada – ela, depois da cerimônia de “plantio”, só deverá ser descida para substituição quando o tecido degenerar.

– Para o seu “plantio” em outros espaços os guardiães deverão definir as bases em conformidade com os anseios de organização e difusão de um ideário de paz.

– O Movimento segue orientação do Comitê Paulista para a Década de Cultura de Paz- Um programa da UNESCO, cujo manifesto anexamos:

Em Janeiro de 2000, o movimento ampliou-se com a parceria do Comitê Paulista da Década de Cultura da Paz (UNESCO), enriquecendo-se com a incorporação dos princípios de ação propostos pelo

Manifesto 2000- UNESCO

  1. Respeitar a vida”. Respeitar a vida e a dignidade de cada ser humano sem discriminação nem preconceito.
  2. Rejeitar a violência”. Praticar a não violência ativa, rejeitando à violência em todas as suas formas: física, sexual, psicológica, econômica e social, em particular contra os mais vulneráveis, tais como as crianças e os adolescentes.
  3. Ser generoso”. Compartilhar meu tempo e meus recursos materiais no cultivo da generosidade e por fim à exclusão, à injustiça e à opressão política e econômica.
  4. Ouvir para compreender. Defender a liberdade de expressão e a diversidade cultural privilegiando sempre o diálogo sem ceder ao fanatismo, à difamação e à rejeição.
  5. Preservar o planeta”. Promover o consumo responsável e um modo de desenvolvimento que respeitem todas as formas de vida e preservem o equilíbrio dos recursos naturais do planeta.
  6. Redescobrir a solidariedade”. Contribuir para o desenvolvimento de minha comunidade, com a plena participação das mulheres e o respeito aos princípios democráticos, de modo a criarmos juntos novas formas de solidariedade.


Antecedentes e outras informações

–  Novembro de 1997- Mudança da Abaçaí Cultura e Arte para o Parque da Água Branca.

– 25 de janeiro 1998 – Realização da primeira versão do Upa, São Paulo!

-25 de Janeiro de 1999- Realização do Upa, São Paulo!, com alvorada no Bairro das Perdizes ao amanhecer.

– Janeiro de 2000- Realização do Upa, São Paulo!, da Vigília Cívico, Ecumênica e Cultural pela Paz ,com o plantio da Bandeira da Paz.

– Logo depois do Revelando São Paulo 2002 em consulta ao Comitê Paulista para a Década da Cultura de Paz, através da Prof. Lia Diskin , decidiu-se pelo agrupamento sob o mote A Paz é o Caminho…,de inspiração gandhiana de várias das açõesem andamento, para otimizar energias e potencializar os resultados, passando o conjunto a ser divulgado como no caput.

O movimento da Bandeira da Paz, no Parque da Água Branca, teve início no aniversário da Cidade de São Paulo, 25 de Janeiro de 1998, quando a Abaçaí Cultura e Arte lançou, em parceria com a cumplicidade de vários artistas e representantes de segmentos religiosos, o movimento Upa, São Paulo! Na véspera, foi organizada uma Vigília cívico, ecumênica e cultural pela Paz, com atividades (apresentações artísticas, alternadas com reflexões, exibições de vídeos, atividades integrativas, descansos), seguido, ao amanhecer do dia 25, de alvorada e um grande abraço simbólico em São Paulo.

O Movimento Upa, São Paulo!, visa, envolver o maior número possível de segmentos da sociedade, organizações sociais e setores públicos em um grande caudal, otimizando-se as ações isoladas afim de que, em seu conjunto:-

Upa,São Paulo!

Uma mobilização permanente pela Vida

“São Paulo, uma desconhecida”

E grande o descaso que, no geral, os habitantes de São Paulo votam à cidade em que nasceram ou que adotaram para viver. Muito pior ainda o tratamento que lhe dispensam os nos veículos de comunicação de massas.

Em que pesem seus muitos e inquestionáveis problemas, de resto comuns a todos as megalópoles, é de se lamentar o desconhecimento que se tem de várias de suas facetas positivas, muitas delas com motivos de sobra para despertar a admiração de paulistanos , paulistas e visitantes em geral. O desconhecimento é também gerador de violência, lembrando a máxima que “Só se ama aquilo que se conhece”.

Paralelamente aos valores de progresso urbano e industrial de São Paulo, que habitualmente são divulgados, ao lado desta São Paulo moderna, altamente industrializada e cosmopolita, persiste, resiste, convive uma outra, rural e bucólica, em simbiose perfeita. Em seus limites podem ser observadas festas populares, de considerável significação social e cultural, além de romeiros, cavaleiros, carroças, charretes e mesmo carros de bois.

Quantas iniciativas  importantes pela cidadania (exercício e despertar), resultantes de ações da sociedade civil ou em parceria com o governo, se consolidam em seus limites!

Durante as comemorações do 447ºaniversário de nossa cidade, criaremos condições para que vários destes elementos sejam colocados em destaque através do projeto Upa, São Paulo!

O Upa deverá ser produzido  buscando uma intervenção em  todo o PAB, respeitando-se  as funções próprias a cada espaço e  buscando- se dinamizar a circulação  do público afluente (apresentações dos grupos de danças folclóricas das comunidades de imigrantes e grupos folclóricos de São Paulo, gincanas sócio – culturais para crianças e adolescentes, atividades variadas de fruição/ e entretenimento, estandes de arte popular, artesanato e culinária).

Do PAB buscaremos articulação com outras atividades/programações, irradiando pela cidade.

Metas e  propostas Para uma Década de Paz

Mobilização permanente pela vida – a paz está em nossas mãos!

Algumas práticas a serem estimuladas:

  • Plantio da bandeira da paz, em caráter permanente, ao lado das bandeiras do Brasil e de São Paulo, nos mastaréis de cada escola e de outras organizações e instituições;
  • Buscar promover atividades informativas e de conscientização (encontros, palestras, ginkanas, bate papos, campeonatos,…) que levem as pessoas a se organizar, interagir, aprimorando-se no exercício da cidadania;
  • Estimular cada escola a realizar nos bairros, com as comunidades, durante a Semana da Pátria, desfiles cívicos de cidadania, levando para as ruas o branco da paz de permeio com o verde/amarelo.

Por uma década de cultura pela Paz

Paz na terra pelos homens de boa vontade

Ao longo destes dois milênios fomos nos habituando a uma idéia de paz transcendental, que se busca e se recebe como um dom divino, e não como uma condição essencial à humanidade e ao mundo. Paz na terra aos homens de boa vontade!

Nos habituamos também com a idéia transcendental de amor, como algo buscado e atingido em momentos especiais, e não como condição essencial e permanente para a nossa estada no mundo, para a nossa salvação coletiva e não individual.

Nos habituamos, ainda, à idéia arcaica de que os  humanos devemos lutar e vencer, para sobreviver. Falamos de competição e luta criando um viver em competição e luta, e não só entre nós, mas também com o meio natural que nos possibilita, como sendo a forma normal do viver.

Entretanto não é a luta o modo fundamental de relação humana, mas a colaboração e o compartilhamento. Não é a agressão a emoção fundamental que define o humano, mas o amor, a coexistência na aceitação do outro como um legítimo outro na convivência, no respeito às diferenças, no compartilhamento. E na justiça.

A competição e a vitória implicam na derrota do outro. Por isso as interações baseadas na competição, no preconceito, na obediência, na negação do outro, na exclusão não podem ser ditas sociais, pois negam nossa condição biológica de seres dependentes do amor; negam o outro como legítimo outro na convivência. A ambição pode, ocasionalmente, levar à riqueza ou ao êxito individual, mas não leva à transformação harmônica do mundo na sabedoria de uma convivência que não vai gerar nem pobreza nem abuso. Coexistência harmônica com o mundo natural, com a consciência de que um espirro mal dado poderá abalar as estrelas.

Assim a paz não é um dom, mas a conseqüência desse amor que se fundamenta nas relações, na aceitação mútua, e, como ele, deve ser cultivada, a cada dia. Tem que ser construída por cada um de nós. É contagiosa. Se a queremos no mundo é preciso começar por tê-la dentro de nós, cultivá-la com todos e não somente com os amigos! Começa na própria rua e se espalha, aos poucos, pelo bairro. Sem concessões a malandrices e sem fugir perante uma injustiça!

 Para se fazer rir toda uma rua, basta começar a rir.

Com a paz há de ser a mesma coisa. Já não nos aconteceu de nos sentirmos felizes, um dia de manhã, mesmo sem motivo, e ao encontrar um desconhecido na rua sentir desejo de lhe dizer: Bom dia, tudo bem? E nesse dia nos sentirmos fortes, capazes de enfrentar quaisquer dificuldades, de ajudar qualquer um?

Amar os outros para os obrigar a amar outros- e assim de seguida em toda a terra! Começa assim a paz! Mas isto não é fácil…

Seguramente estas sejam, aproximadamente, as idéias de muitos de nós. E se é indispensável que haja alguém que dê o primeiro passo, a esta altura já somos muitos a fazê-lo. E o primeiro passo já foi dado. E, porque estamos assim de acordo, com os corações abertos, certamente a paz será um fato em nossa cidade.

Toninho Macedo

 Dezembro de 1999 – Inspirado nas idéias de Gilbert Cesbron, expressas em

Os Santos vão para o inferno”e de Humberto Maturana,

 bem como nos esforços das vivências da Abaçaí Cultura e Arte.

Núcleos de sustentação

Foto Parque da Juventude

1) O que são os núcleos?

Composto por pessoas e instituições com o intuito de refletir, promover e vivenciar uma Cultura de Paz, organizam-se em redes de intercâmbio de informações, que compartilham experiências e conceitos referentes à Cultura de Paz.

Os Núcleos de Sustentação compõe a grande rede de Cultura de Paz. Cada nó integrante da rede é, ao mesmo tempo, receptor e produtor ativo de informação.

A Cultura de Paz contempla e cultiva um mundo plural e solidário, com responsabilidade no  desenvolvimento da comunidade humana nos aspectos econômico, cultural, espiritual, político e social e em harmonia com a natureza.

Abrange responsabilidades e atitudes como:

– desenvolvimento humano;

– qualidade de vida;

– generosidade;

– educação perante a vida;

– sustentabilidade;

– conhecer, compreender e conviver com a diversidade cultural.

O desenvolvimento humano, segundo Hamilton Faria (in Educação e Cultura de Paz), é a conquista de uma vida saudável e longa, o acesso a bens e serviços que possibilitem uma existência digna, pessoal e coletiva; o acesso a conhecimentos úteis e a valores éticos e o reconhecimento dos direitos políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais construídos com cidadania e participação; a possibilidade de produzir e exprimir a criatividade e construir com diversidade um rico imaginário; realização de uma cultura do ser e não do ter.

E assim, promover a Educação e Cultura para a Paz.

2) Objetivos

A Rede da A Paz é o Caminho…começou a ser formada e implementada a partir do plantio da 1º Bandeira da Paz em 25 de Janeiro de 2000, no Parque da Água Branca, passando a ser seu nó referencial. A partir de então ramificou-se por diferentes municípios do Estado de São Paulo a partir de Núcleos de Sustentação no entorno de cada bandeira plantada e originando micro-redes.

Os objetivos permeiam em:

– Contribuir para construção e consolidação de uma Educação e Cultura de Paz por meio da reflexão, investigação, educação, vivência e ação;

– Favorecer o desenvolvimento da autonomia, valorizar o diálogo e a cooperação, o que significa prevenir conflitos, promover a saúde do tecido social e a convivência positiva, pressupondo o mundo como multicultural e multifacetado, assim sendo rspeitado;

– Promover o acesso a conhecimentos úteis e a valores éticos e o reconhecimento dos direitos políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, construídos com cidadania e participação;

– Ampliar os conhecimentos produzidos e apropriados para além dos contornos institucionais já estabelecidos, ou seja, englobando e conscientizando a sociedade ao entorno num enfoque crescente.

3) Compromissos

Os núcleos de sustentação são os guardiões da Bandeira da Paz, tendo como  compromisso o zelo permanente de cultivar a Cultura de Paz a partir do “plantio” da bandeira. O conceito de plantio tal qual como os organismos vivos, deve ser cuidado, acompanhado, tratado. O cultivo da Cultura de Paz ocorre pela informação que é o conhecimento a partir do contato, reflexão e compreensão da informação, e assim a tomada de consciência de nós mesmos, do outro e da teia de relações que sustentam o mundo.

 4) Componentes

Uma das características para a composição dos núcleos de sustentação é o hibridismo (composto por pessoas de diversos níveis sociais, atuações profissionais diversificadas, distintas faixas etárias e diferentes segmentos religiosos). Assim, abrange e envolve diversos perfis de pessoas a atuarem nos núcleos, de maneira integrada e complementar, fortalecendo a diversidade de conhecimentos e ações.

5) Atividades

O Plantio da Bandeira da Paz é o marco inicial para as atividades do Núcleo de Sustentação da Bandeira da Paz. Para seu “hasteamento”(plantio) são levados em consideração alguns princípios:

  • Em espaços públicos e em caráter oficial: colocando-se de frente para o conjunto de mastros, o central é sempre o principal e destinado à Bandeira Nacional. A sua direita estará a segunda em importância, seguindo-se à direita desta o espaço reservado para a Bandeira da Paz.
  • Para seu plantio em outros espaços os guardiões deverão definir as bases em conformidade com os anseios de organização e difusão de um ideário.
  • Permanentemente desfraldada, a bandeira, depois da cerimônia de “plantio”, só deverá ser descida para substituição quando o tecido degenerar.
  • A substituição da Bandeira deve acontecer a cada 4 meses aproximadamente, de acordo com seu estado de conservação.

As atividades são baseadas na vinculação e mobilização de redes de instituições, organizações e pessoas que identificam e compartilham seus compromissos com valores da Cultura de Paz, promovendo encontros regulares. Estas devem ser oportunidades de reflexões a partir de leituras de textos conceituais e textos referentes a atividades/mobilizações/manifestos, ou seja, práticas da sociedade civil e pública tendo como eixo o tema da cultura de paz; vivências interativas entre os participantes do núcleo com atividades artísticas, corporais, cooperativas; palestras e com partilhas de experiências. Isto é o que conferirá sentido ao tremular da Bandeira da Paz, em cada espaço e  no âmbito de cada Núcleo com a sua micro-rede.

A comunicação regular deve ser alimentada pela grande rede, pela via dos meios de comunicação, pela internet e telefone, promovendo o acompanhamento, o compartilhar de informações e discussões na promoção da educação para uma Cultura de Paz/um mundo melhor.

Enfatizando a necessidade de espaços de conversação para promover encontros presenciais, serão promovidos encontros eventuais a partir da grande rede, envolvendo todos os núcleos com suas micro-redes. Nestes encontros os participantes da grande rede têm oportunidade de estabelecer contatos, conversar, trocar idéias e intercambiar experiências, se reconhecer no outro, construir sensos de identidade, comparar diferenças e criar vínculos afetivos.

Tais encontros podem ser de tipos variados: desde contatos de articulação e reuniões de trabalho (encontros de pequeno porte), passando por grupos de estudos, rodas de conversação, cursos e palestras a eventos de maior envergadura, como seminários ou congressos.

 Encontros presenciais podem ter caráter de trabalho, de decisão, de intercâmbio técnico, de manifestação política ou somente de interação pessoal, festa e descontração. Não importa o seu formato, feitio ou ambição. Os encontros presenciais são capazes de animar a participação, porque se constituem em espaços de conversação nos quais as humanidades podem se reconhecer e se realimentar.

6) A Rede

Conceito

A Paz é o Caminho articula-se e atua pelo viés do conceito de rede. As características de rede são: quantidade, dispersão geográfica e interligação. É uma forma de organização caracterizada fundamentalmente pela sua horizontalidade, isto é, pelo modo de inter-relacionar os elementos sem hierarquia.

Tem como outras características: o poder criador de ordens novas e seu caráter libertador; sua natureza é democrática, aberta e emancipatória; e como grande qualidade vibrante é produtora de uma multiplicidade de ações e opções próprias da conectividade.

O conceito de rede transformou-se, nas últimas duas décadas, em uma alternativa prática de organização, possibilitando processos capazes de responder às demandas de flexibilidade, conectividade e descentralização das esferas contemporâneas de atuação e articulação social.

A sociedade civil se organiza em redes para a troca de informações, a articulação institucional e política e para a implementação de projetos comuns.

Redes são sistemas organizacionais, verdadeiros rizomas, capazes de reunir indivíduos e instituições, de forma democrática e participativa, em torno de objetivos e/ou temáticas comuns.

Estruturas flexíveis e cadenciadas, as redes se estabelecem por relações horizontais, interconexas e em dinâmicas que supõem o trabalho colaborativo e participativo, e se sustentam pela vontade e afinidade de seus integrantes, caracterizando-se como um significativo recurso organizacional, tanto para as relações pessoais quanto para a estruturação social.

Características

Os compromissos de funcionamento da Cultura de Paz são gerenciados como uma grande rede de relacionamento entre os nós da rede. Entretanto, há alguns parâmetros que norteiam a interação e devem ser considerados por quem queira trabalhar colaborativamente; uma espécie de código de conduta para a atuação em rede:

Pactos e Padrões de Rede:

A comunicação e a interatividade se desenvolvem a partir dos pactos e dos padrões estabelecidos em comunidade. Uma rede é uma comunidade e, como tal, pressupõe identidades e padrões a serem acordados pelo coletivo responsável. É a própria rede que vai gerar os padrões a partir

dos quais os envolvidos deverão conviver. É a história da comunidade e seus contratos sociais.

Valores e objetivos compartilhados:

O que une os diferentes membros de uma rede é o conjunto de valores e objetivos que eles estabelecem como comuns, interconectando ações e projetos.

Participação:

A participação dos integrantes de uma rede é que a faz funcionar. Uma rede só existe quando em movimento. Sem participação, sem atuação, deixa de existir. Ninguém é obrigado a entrar ou permanecer numa rede. O alicerce da rede é a vontade de seus integrantes.

Colaboração:

A colaboração entre os integrantes deve ser uma premissa do trabalho. A participação deve ser colaborativa!

Multiliderança e horizontalidade:

Uma rede não possui hierarquia nem chefe. A liderança provém de muitas fontes. As decisões também são compartilhadas.

Conectividade:

Uma rede é uma costura dinâmica de muitos pontos. Só quando estão ligados uns aos outros e interagindo é que indivíduos e organizações mantêm uma rede.

Realimentação e Informação:

Numa rede, a informação circula livremente, emitida de pontos diversos, sendo encaminhada de maneira não linear a uma infinidade de outros pontos, que também são emissores de informação. O importante nesses fluxos é a realimentação do sistema: retorno, feedback, consideração e legitimidade das fontes são essenciais para a participação colaborativa e até mesmo para avaliação de resultados e pesquisas.

Descentralização e Capilarização:

Uma rede não tem centro. Ou melhor, cada ponto da rede é um centro em potencial. Uma rede pode se desdobrar em múltiplos níveis ou segmentos autônomos – “filhotes” da rede -, sendo capazes de operar independentemente do restante da rede, de forma temporária ou permanente, conforme a demanda ou a circunstância. As micro-redes têm o mesmo “valor de rede” que a estrutura maior à qual se vinculam.

Dinamismo:

Uma rede é uma estrutura de grande plasticidade, dinâmica, cujo movimento ultrapassa fronteiras físicas ou geográficas. As redes são multifacetadas. Cada retrato da rede, tirado em momentos diferentes, revelará uma face nova.

7) Parcerias

O Movimento A Paz é o Caminho – Rede da Bandeira da Paz  – Núcleos de Sustentação, seguiram para sua criação orientações do Comitê Paulista para a Década de Cultura de Paz – um programa da Unesco, cujo manifesto propõe:

Manifesto 2000

  1. “Respeitar a vida”

Respeitar a vida e a dignidade de cada ser humano sem discriminação nem preconceito.

  • “Rejeitar a violência”

Praticar a não-violência ativa, rejeitando à violência em todas as suas formas: física, sexual, psicológica, econômica e social, em particular contra os mais vulneráveis, tais como crianças e adolescentes.

  • “Ser generoso”

Compartilhar meu tempo e meus recursos materiais no cultivo da generosidade e por fim à exclusão e à opressão política e econômica.

  • “Ouvir para compreender”

Defender a liberdade de expressão e a diversidade cultural privilegiando sempre o diálogo sem ceder ao fanatismo, à difamação e à rejeição.

  • “Preservar o planeta”

Promover o consumo responsável me um modo de desenvolvimento que respeitem todas as formas de vida e preservem o equilíbrio dos recursos naturais do planeta.

  • “Redescobrir a solidariedade”

Contribuir para o desenvolvimento de minha comunidade, com a plena participação das mulheres e o respeito aos princípios democráticos, de modo a criarmos juntos novas formas de solidariedade.

 

2 – Implementações

8 passos para a implementação

da Cultura de Paz no Município

  1. Convite a todos os segmentos: população, líderes religiosos e/ou a-religiosos, organizações sociais, culturais, educacionais, etc., para fomento da Cultura de Paz, do diálogo Transreligioso, respeito entre todos os seres viventes, etc.
  2. Realização de uma roda de conversação sobre a Cultura de Paz e os melhores caminhos para serem traçados. Cooperação de todos!
  3. Entrar em contato com a Abaçaí, diretamente com Emerson Pantaleo Caparelli, para tirar dúvidas e para marcar a data e local do ‘plantio’ da Bandeira da Paz.
  4. Importante: O mastro da Bandeira é de responsabilidade do município, ao que sugerimos a medida de 6 a 8 metros. A Bandeira branca para o 1° plantio será oferecida pela Abaçaí Cultura e Arte.
  5. No dia do ‘plantio’ ou troca da Bandeira da Paz, é bom um convite amplo para as autoridades, imprensa e público em geral.
  6. Reuniões regulares para troca de experiência e melhor qualidade no fomento e construção da Cultura de Paz. Traçar um planejamento e encaminhar à Abaçaí.
  7. Contato, diálogo e interação com demais núcleos da Cultura de Paz.
  8. Estimular o estudo e prática da Cultura de Paz, em todas suas formas, bem como a prática da gentileza, solidariedade, educação, igualdade entre todos os seres e não-violência direta ou indiretamente, despertando assim, a Beleza que há na Diversidade e no Respeito entre todos os seres.

E a “Paz, como se faz?”

Retirado da página 11 do Caderno Paz, como se faz? da Associação Palas Athena

– Por Lia Diskin e Laura Gorresio Roizman

Respeitar a vida

“Observe atentamente o caminho que seu coração aponta

e escolha esse caminho com todas as forças”

Provérbio hassídico

Muito tempo passou, desde o início do universo, até surgir a vida humana. E ainda foi preciso muito mais para que aflorassem, no mundo, as mentes inteligentes e capazes dos seres humanos. O mais impressionante é pensar que a vida, que existe há tão pouco tempo, já está ameaçada. Dizem os biólogos que uma espécie viva está desaparecendo do planeta a cada vinte minutos. Em centésimos de segundo, aquelas mesmas mentes inteligentes podem destruir centenas de seres vivos: basta apertar um botão! Com frequência, mostram as estatísticas, um simples apertar de gatilho interrompe uma vida jovem, com sonhos, paixões, talentos.

A violência nas grandes cidades vitima milhares de pessoas, principalmente jovens. Por isso temos que praticar e disseminar, o máximo que pudermos, o resgate da vida, a defesa da vida, o respeito à vida. Precisamos começar refletindo sobre algumas lições que a própria vida nos passa. Em primeiro lugar, é fundamental compreender que, apesar dos surpreendentes avanços da ciência, é absolutamente impossível recriar todas as formas de vida em laboratório. Infelizmente, sabemos destruir, com diversos tipos de armas — nucleares, químicas e biológicas — toda e qualquer vida na Terra. Mas não sabemos como, nem por onde começar a restaurá-la.

Podemos dizer que alguma coisa é viva quando ela gera a si mesma. Se batemos a bicicleta em um poste e alguma parte se quebra, precisamos consertá-la, trocar peças, ajustá-la, refazer a pintura etc. Mas se ralamos o braço, nosso corpo consegue se “consertar” sozinho, pois as células podem se reproduzir e cicatrizar a ferida. Apesar de tão esplêndido, esse fenômeno passa totalmente desapercebido aos nossos olhos. Estamos tão acostumados a encontrar outras pessoas caminhando à nossa frente, a ver as árvores alimentando os pássaros e insetos que esquecemos, literalmente, de admirar a vida em seu mistério. O milagre se tornou comum: mulheres grávidas em países em guerra, ovos eclodindo em terras áridas, a grama brotando das frestas do asfalto de cidades maltratadas pela violência.

A vida é criativa. Observe as folhas de uma árvore. Se olhar atentamente, perceberá que não existe uma folha igual à outra! O mesmo acontece quando observamos as multidões caminhando pelas ruas: quantas pessoas diferentes umas das outras! Na família humana, em todo nosso planeta, abraçamos um número imenso de raças, culturas, religiões, visões de mundo, valores…

E, logicamente, é impossível que todo mundo pense do mesmo jeito: alguns gostam do verão, outros preferem o inverno… O problema começa quando resulta difícil aceitar o ponto de vista do outro. Perdemos a paciência, nos tornamos intolerantes, discutimos e, sem querer, podemos utilizar a violência para lidar com esse conflito. Em uma atitude imediatista e impensada, corremos o risco de desrespeitar a vida, machucando nosso semelhante com palavras, gestos, atitudes… É exatamente assim que começam as brigas e as guerras. E é justamente esta espiral de violência que queremos eliminar.

Para compreender a arte da aceitação do outro, podemos aprender com nossa maior mestra: a própria vida, bem maior do universo, que insiste em pulsar a cada instante. Teima em se concretizar, perfeita e harmonicamente. Observe as bactérias, seres muito simples, de um passado remoto, que “moram” em todas as células humanas, trabalhando no processo de produção de energia, como parceiras em nosso corpo. O que seria do cérebro sem os pulmões? Os rins sobreviveriam sem seu companheiro coração? Em nosso organismo, podemos afirmar sem pestanejar, existe respeito e ajuda mútua desde a pequena célula até os nossos órgãos mais sofisticados. Todas as pequenas partes trabalham juntas, operando o milagre. Esse é apenas um exemplo de associação, cooperação. Fenômenos de natureza amorosa que sustentam o princípio da vida.

Vamos continuar estudando a vida: ao caminhar em uma mata ou à beira-mar, observando um pôr-do-sol, estabelecemos uma sensação imediata de paz, acolhimento, e harmonia com a Terra. O mesmo podemos dizer quando uma mãe abraça seu bebê. O amor é o combustível fundamental da humanidade, o alicerce da vida no planeta. É um bem-estar espontâneo, fácil, natural, que precisa ser redescoberto. Cabe a cada um de nós empreender essa viagem interior, ao encontro da bondade humana, virtude presente em todas as culturas.

Mas e no nosso organismo maior, a sociedade? Existe essa mesma sintonia? O que seria de nós sem os empregados das usinas hidroelétricas que produzem energia? Sem os padeiros, médicos e lixeiros? Músicos, jornalistas e camponeses? Dependemos uns dos outros para sobreviver…

 Infelizmente, esse fato é freqüentemente esquecido, nos diversos cantos do planeta, a cada instante.

Se pudéssemos observar com uma lente de aumento a saúde da sociedade humana, perceberíamos muita dor e sofrimento. Muitos não encontram oportunidades de moradia, alimento,

trabalho. A desigualdade social é uma dura realidade de nossos dias, uma situação de profundo desrespeito à vida.

Será que podemos fazer algo para construir um mundo mais justo, mais cooperativo? A injustiças e desigualdades são tantas que, muitas vezes, é mais cômodo nos sentirmos magoados e revoltados… Mas, de alguma maneira, precisamos aprender que a paz está em nossas mãos: a sociedade do futuro depende de nós! Cabe a cada um de nós cuidar da vida, em seu aspecto pessoal, social e planetário. omento de Conexão entre várias culturas com um mesmo ideal: A Paz na Terra –

Revelando São Paulo Capital 2008, Memorial da América Latina

Paz na terra pelos homens de boa vontade

Sim, pelos homens, todos de boa vontade

Ao longo destes dois milênios fomos nos habituando a uma idéia de paz transcendental, que se busca e se recebe como um dom divino, e não como uma condição essencial à humanidade e ao mundo. Paz na terra aos homens de boa vontade!

Nos habituamos também com a idéia transcendental de amor, como algo buscado e atingido em momentos especiais, e não como condição essencial e permanente para a nossa estada no mundo,

 para a nossa salvação coletiva e não individual.

Nos habituamos, ainda, à idéia arcaica de que os  humanos devemos lutar e vencer, para sobreviver. Falamos de competição e luta criando um viver em competição e luta, e não só entre nós, mas também com o meio natural que nos possibilita, como sendo a forma normal do viver.

Entretanto não é a luta o modo fundamental de relação humana, mas a colaboração e o compartilhamento. Não é a agressão a emoção fundamental que define o humano, mas o amor, a coexistência na aceitação do outro como um legítimo outro na convivência, no respeito às diferenças, no compartilhamento. E na justiça.

A competição e a vitória implicam na derrota do outro. Por isso as interações baseadas na competição, no preconceito, na obediência, na negação do outro, na exclusão não podem ser ditas sociais, pois negam nossa condição biológica de seres dependentes do amor; negam o outro como legítimo outro na convivência.  A ambição pode, ocasionalmente, levar à riqueza ou ao êxito individual, mas não leva à transformação harmônica do mundo na sabedoria de uma convivência  que não vai gerar nem pobreza nem abuso. Coexistência harmônica com o mundo natural, com a consciência de que um espirro mal dado poderá abalar as estrelas.

Assim a paz não é um dom, mas a consequência desse amor que se fundamenta nas relações, na aceitação mútua, e, como ele, deve ser cultivada, a cada dia. Tem que ser construída por cada um de nós. É contagiosa. Se a queremos no mundo é preciso começar por tê-la dentro de nós, cultivá-la com todos e não somente com os amigos! Começa na própria rua e se espalha, aos poucos, pelo bairro. Sem concessões a malandrices e sem fugir perante uma injustiça!

Para se fazer rir toda uma rua, basta começar a rir.

Com a paz há de ser a mesma coisa. Já não nos aconteceu de nos sentirmos felizes, um dia de manhã, mesmo sem motivo, e ao encontrar um desconhecido na rua sentir desejo de lhe dizer: Bom dia, tudo bem? E nesse dia nos sentirmos fortes, capazes de enfrentar quaisquer dificuldades, de ajudar qualquer um?

Amar os outros para os obrigar a amar outros- e assim de seguida em toda a terra! Começa assim a paz! Mas isto não é fácil…

Seguramente estas sejam, aproximadamente, as ideias de muitos de nós. E se é indispensável que haja alguém que dê o primeiro passo, a esta altura já somos muitos a fazê-lo. E o primeiro passo já foi dado. E, porque estamos assim de acordo, com os corações abertos, certamente a paz será um fato em nossa cidade.

Toninho Macedo – Dezembro de 1999

Inspirado nas idéias de Gilbert Cesbron, expressas em “ Os Santos vão para o inferno”e de Humberto Maturana, bem como nos esforços das vivências da Abaçaí Cultura e Arte.

4- Ética planetária

Willys Harman House – Clube de Budapeste

Os dez princípios da ética planetária

Estas são as diretrizes do Clube de Budapeste para pensar globalmente e moralmente na aurora do século XXI. São baseadas em valores que representam o interesse esclarecido de todos os seres humanos, culturas, sociedades e vida na biosfera.


Viva com respeito pelos outros e pela Natureza

1. Viva de uma maneira que satisfaça suas necessidades básicas sem tirar dos outros a oportunidade de satisfazerem as necessidades deles.

2. Viva de uma maneira que respeite o direito inalienável de todas as pessoas à vida e ao desenvolvimento, onde quer que elas vivam e quaisquer que sejam suas origens étnicas, sexo, nacionalidade, posição social e sistema de crenças.

3. Viva de uma maneira que respeite o direito intrínseco à vida, e a um ambiente que dê apoio à vida, de todas as coisas que vivem e crescem na Terra.

4. Busque a felicidade, a liberdade e a realização pessoal em harmonia com a integridade da Natureza e levando em conta as buscas similares de seus semelhantes na sociedade.

Aja para criar um mundo melhor

5. Exija de seu governo que se relacione com os outros povos e países pacificamente e num espírito de cooperação, reconhecido as aspirações legítimas de todos os membros da comunidade internacional por uma vida melhor e um meio ambiente saudável.

6. Exija das empresas que manifestem preocupação adequada pelo bem-estar de todos os seus takeholders e pela sustentabilidade do meio ambiente, produzindo bens e oferecendo serviços que satisfaçam a demanda corrente sem degradar ou poluir a Natureza e sem reduzir as oportunidades das pessoas pobres de participar da economia nem as oportunidades das empresas locais de competir no mercado.

7. Exija dos meios de comunicação que divulguem informações contínuas e confiáveis sobre as tendências básicas e os processos cruciais, assim permitindo que os cidadãos e os consumidores tomem decisões abalizadas sobre questões que afetam sua saúde, sua prosperidade e seu futuro.
8. Abra espaço em sua vida para ajudar os menos favorecidos do que você a viver com dignidade básica e trabalhe com pessoas de mente semelhante à sua, próximas ou distantes, para preservar ou restaurar os equilíbrios essenciais do meio ambiente.

Desenvolva sua consciência para desenvolver o espírito humano

9. Desenvolva sua consciência para perceber a interdependência vital e a unidade essencial da família humana, para aceitar e apreciar sua diversidade individual e cultural, e para reconhecer que uma consciência alcançando-se à dimensão planetária é um imperativo para a sobrevivência humana no século XXI.

10. Use o exemplo e a orientação da sua consciência em expansão para inspirar e motivar os jovens (e pessoas de todas as idades) a desenvolverem aquele espírito que lhes dará o poder de tomar decisões morais sobre as questões críticas que decidirão o futuro deles próprios e o futuro de toda a humanidade.

O Poder em uma Cultura de Paz

análise, reflexão e propostas

Prof. Dr. Guilherme Assis de Almeida

Hannah Arendt, uma das mais destacadas filósofas e cientistas políticas do século XX, criou uma definição de poder em que não existe a noção de violência – a convivência pacífica entre homens e mulheres propicia a ação conjunta, que por sua vez gera poder. Essa ação conjunta possibilita, por meio da palavra, a revelação de cada indivíduo na sua singularidade.

A ausência da violência é imprescindível, pois na comunicação humana não se objetiva atingir determinado fim, mas descobrir uma meta comum que sirva como elemento aglutinador. Quando a palavra é usada apenas para atingir um fim específico, ela perde sua característica de revelação, isto é, seu sinal mais distintivo.

No século XX, foi Mahatma Gandhi, através do satyagraha, quem melhor levou à prática a teoria arendtiana do poder enquanto agir conjunto. A ação política gandhiana é simples e inovadora, baseia-se em três pontos fundamentais:

1) a não-violência (ahimsa) como princípio da ação;

2) satyagraha como forma de resistência (greve, desobediência civil, jejum), que se apoia num exame criterioso dos fatos e num sincero empenho para entender o adversário; e,

3) o exercício da não-violência ativa para evidenciar a injustiça da situação.

O objetivo a ser alcançado é a libertação coletiva e individual (swaraj), lembrando sempre que os fins, por nobres que sejam, nunca justificam o abuso do poder nem da autoridade.

Prof. Dr. Guilherme Assis de Almeida

Doutor pelo Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Universidade de São Paulo. Ex-consultor jurídico do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) e, atualmente, pesquisador sênior do Núcleo de Estudos da Violência (NEV), da USP. É co-autor do livro Curso de Filosofia do Direito, e autor de Direitos Humanos e Não-violência, ambos da Editora Atlas.

16º Fórum do Comitê Paulista para a Década da Cultura de Paz

– um programa da UNESCO –

6- Educação e cultura da paz

Hamilton Faria

Este não é um tema a mais para enriquecer o rico repertório de reflexões sobre a cidadania ou os caminhos da educação no país. Este é um tema chave para a compreensão do mundo atual e para a mudança radical de nossos paradigmas civilizatórios. Além de conter, talvez, o maior potencial mobilizador do milênio a cultura da paz aponta para uma nova condição do ser em sociedade. Qualquer movimento social ou cultural, as políticas públicas e a ação cotidiana deverão, no presente e no futuro, inevitavelmente, unir-se a este feliz binômio: educação – cultura da paz.

Rápido diagnóstico do mundo contemporâneo

Somos viventes e emergentes de um século marcado pela violência e por uma cultura da violência. As construções políticas e geopolíticas, comerciais e culturais do século XX, ao lado de muitas conquistas no campo da cidadania e do desenvolvimento tecnológico, passaram por processos bastante violentos. Se fizermos um breve retrospecto veremos um mundo palco de crimes sociais hediondos: a guerra de 1914-8 com seus milhões de mortos e utilização de gases venenosos; a guerra civil espanhola, em que o fascismo eliminou resistentes e população civil; a segunda guerra mundial com seus cinqüenta milhões de mortos e seus tristes campos de Dachau, Auschwitz, Treblinka; Hiroshima e Nagasaki, vingança exemplar da maior potência da história, com seus 200 mil mortos; a guerra do Vietnã, Laos, Cambodja, com cerca de 1 milhão de mortos; o resultado soturno das ditaduras do socialismo real e das genocidas ditaduras latino-americanas; segue-se o genocídio de Sabra e Chatila, a guerra do Iraque, Kosovo, e o massacre recente promovido pelo exército israelense nos campos de Jenin. Sem falar das guerras emancipatórias: revoluções russa, cubana, chinesa e contra o colonialismo na África e na Índia. Depois que quase tudo isso cessou, após 1945, ainda tivemos 150 guerras com 20 milhões de mortos.

O século XX foi, sem dúvida, um século de mortes. Com o final da guerra fria entramos num mundo tenso, complexo e inseguro marcado pela acumulação de armas químicas, biológicas, bacteriológicas, com a presença de estados terroristas modernos e tradicionais e a proliferação de grupos terroristas estatais e paramilitares.

Jamais poderemos esquecer que vivemos no cenário de uma guerra social sem precedentes na história da humanidade. A cúpula social de Copenhague traçou, em 1985, um quadro alarmante: “Mais de 1 bilhão de seres humanos vivem numa pobreza abjeta, passando a maior parte deles fome todos os dias. E mais de 120 milhões no desemprego e muito mais no subemprego”. A crise social expande-se pelo desenraizamento e despertencimento, fruto da imposição de modos de vida pela modernidade, materializados em sociedades que perderam, em grande parte, a moralidade, os valores éticos e espirituais. Hoje é possível diagnosticar uma fratura societária marcada pela exclusão social e cultural, a violência cotidiana e a degradação ambiental, que traz como resultado um estilo de vida individualista e consumista e a perda dos laços de solidariedade entre as pessoas

e no interior das comunidades.

O Brasil, com seus indicadores de desenvolvimento humano já conhecidos, a fome de um quinto da  população e 40 mil homicídios anuais, é mais do que um reflexo da cultura da violência no mundo contemporâneo.

O Papel da Educação

Aqui os processos educativos ganham uma centralidade talvez jamais vista na história  contemporânea, não apenas considerando a escola formal mas também a “escola da vida”, que é constituída por outros espaços, experiências e saberes. A educação ganha um sentido cada vez mais claro de contribuir para o desenvolvimento humano, e não só de qualificar jovens e adultos para o mercado de trabalho. Como diz estudo da UNESCO: “A educação não serve, apenas, para fornecer pessoas qualificadas ao mundo da economia: não se destina ao ser humano enquanto agente econômico, mas enquanto fim último do desenvolvimento”. Surpreende-me que o discurso corrente ainda seja aquele de preparar o educando para o mercado de trabalho. Escolas marcadas pela lógica empresarial já chamam seus alunos de clientes. Sem comentários.

Mas, afinal, o que é desenvolvimento humano? Desenvolvimento humano é a conquista de uma vida mais saudável e longa, o acesso a bens e serviços que possibilitem uma existência digna, pessoal e coletiva. Mais: o acesso a conhecimentos úteis e a valores éticos e o reconhecimento dos direitos políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais construídos com cidadania e participação. Mais ainda: a possibilidade de produzir e exprimir a criatividade e construir com diversidade um rico imaginário. Finalmente: a realização de uma cultura do ser e não apenas do ter. A partir desse referencial já podemos concluir que a educação está predestinada, cada vez mais, a ter um papel complexo e fascinante no desenvolvimento humano.

Mas se o seu papel é aprimorar o desenvolvimento humano e não apenas qualificar estudantes para o mercado de trabalho, nem mesmo simplesmente reverenciar  valores do passado, como devemos compreender o processo educativo? Retomo a discussão da UNESCO sobre os quatro pilares da educação, pois essa forma de apresentar é a mais completa das que tenho conhecimento. Essa separação em quatro itens é convocada e assinada pela UNESCO, mas conta com a presença dos maiores educadores e pensadores do planeta.  A partir desta apresentação didática faço a minha reflexão, fruto de experiências com educação e cultura e de encontros nacionais e internacionais de que tenho participado ao longo dos últimos vinte anos.

Aprender a conhecer

Sem dúvida este, desde sempre, é um pilar da educação. Conhecer é uma das finalidades da vida dos seres humanos. Conhecer, descobrir mundos imagináveis e inimagináveis. Mas devemos nos perguntar: conhecer o quê? O procedimento científico de interpretar o mundo? Existem sociedades cujo cogito é diferente do nosso; isso acontece mesmo no interior de nossa sociedade. Aprendi com um indiano que, na Índia, a mais importante forma de comunicação é o silêncio, depois o gesto e, por último, a palavra. No mundo ocidental ocorre o inverso. Portanto, a educação deve nos permitir conhecer o nosso mundo e suas diferentes culturas, mas também outros mundos que se cruzam, com os processos transculturais. Não é justo que negros e índios tenham que ser reeducados com nossas categorias e modos de ver e tenham que se integrar ao mundo dos brancos negando sua própria essência, sua ancestralidade, sua cultura. Há alguns anos o Conselho da Condição Negra da Bahia luta para incluir no currículo das escolas a capoeira, a música afro, a religiosidade negra. Por outro lado, o conhecer não diz respeito apenas à ciência ou aos livros, mas também ao corpo, às habilidades manuais, ao sentir, às dimensões espirituais. A escola neste milênio terá que abrir sua mente e as portas para outros saberes não-oficiais ou formais, para a multifacetada experiência humana, contribuindo para novas sínteses oriundas dos saberes e da transdisciplinaridade.

Aprender a fazer

Este é um tema amplo. Aprender a fazer é desenvolver capacidades individuais e coletivas: habilidades profissionais, artísticas, científicas, comunicacionais, políticas etc. Para aprender a fazer é vital democratizar a palavra, vivenciar desde a infância a democracia, perder o medo da rígida hierarquia escolar, desenvolver competências e acrescentar humanidade às pessoas, com uma visão de sociedade sustentável. Aqui a chave é o pensar-agir, a coerência entre o conhecer e a aplicação prática do conhecimento, a transformação da realidade pela construção de parâmetros éticos na vida cotidiana.

Aprender a viver juntos

Este talvez seja o maior desafio do processo educativo. Aqui é fundamental o reconhecimento da diversidade e o respeito aos valores do pluralismo. A escola ainda não está preparada para reconhecer e dialogar com as diferenças. A dialogia na comunidade escolar é pobre. Os professores, além da troca de cumprimentos e idéias rápidas na sala dos professores e nos intervalos, conversam muito pouco entre si; entre eles e os alunos há uma autêntica muralha: estes desconfiam daqueles; grande parte dos professores se consideram donos do poder e do saber e matam o espírito crítico do aluno e a curiosidade; não há uma cultura de relacionamento entre professores, alunos e funcionários, todos são considerados mão-de-obra pronta para servir e não sujeitos dos processos educativos. O saber formal é muito autoritário e impõe duras verdades à realidade escolar. Recomendo aos supervisores que repensem o seu papel, a sua função nos processos educativos, colocando-se não apenas como fiscais da discutível qualidade de ensino, mas como transformadores de realidades e impulsionadores de novos paradigmas da educação. Com esse horizonte os supervisores poderão vir a ser elos vitais para a construção da cultura da paz na comunidade escolar. Ações de cooperação entre alunos e entre a escola e a comunidade devem ser centrais nas atividades escolares, pois o sucesso individual e a competição estão norteando a vida em sociedade e o imaginário social.

Aprender a ser

Esta deveria ser a finalidade última de todo processo educativo na família, na vida religiosa e comunitária, na vida escolar. Para aprender a ser, o estudante deve ser formado integralmente: inteligência, sensibilidade, responsabilidade social e pessoal, ética, espiritualidade etc. Diferentemente de uma educação tradicionalista, deve-se privilegiar o direito de criar, fundador da cultura, e construir-se como sujeito. O lugar da arte deveria ser mais destacado na educação. Ela contribui para o aperfeiçoamento do ser, forma comunidades de emoção e pessoas sensíveis à vida.
Trabalhos culturais com arte contribuem para o desenvolvimento da auto-estima e da sociabilidade do jovem, componentes indispensáveis da cidadania.

Caminhos para a construção de uma cultura da paz por meio da Educação

Entendemos por cultura da paz a consciência permanente dos valores da não-violência social. A cultura da paz vai mais longe do que construir a paz. Cultura da paz não é simplesmente ausência de guerra. É diferente também de passividade e resignação. Ela não elimina oposições ou conflitos, mas pressupõe a resolução pacífica deles. E resolver os conflitos sociais de forma pacífica é uma mudança radical nos paradigmas que dão sustentação ao atual modelo civilizatório.
Passo então a comentar alguns pressupostos definidores da cultura da paz apontados pela UNESCO.
Vivemos hoje a possibilidade concreta de destruição das formas de vida, é a primeira vez que isso acontece no planeta. Outras civilizações anteriores não tinham esse poder de fogo. Criamos uma civilização que não respeita a vida, pois aprendemos a sujeitar a natureza aos nossos desígnios. Respeitá-la em todos os níveis é o início de uma cultura da paz. “Tudo que vive é o teu próximo”, disse Gandhi. Devemos desenvolver um amplo cuidado para com as crianças, com os idosos, com os pais e filhos, com a comunidade dos seres vivos, animais e vegetais, com o outro e com nós mesmos. A educação deve voltar-se para ensinar continuamente o respeito à vida.
Rejeitar a violência é a base da cultura da paz. Não só a violência criminalizada, passível de condenação judicial, mas também aquela naturalizada, não reconhecida pelos cidadãos, que passa distante do processo e da punição. Aquela presente nas relações autoritárias existentes na família, o despotismo no local de trabalho, as relações de caráter racista e sexista, que muitas vezes aparecem sutilmente na repressão e no terrorismo estatal e de grupos privados escondidas atrás de uma aparente “boa causa”.

A cultura da paz rejeita a violência física, sexual, étnica, psicológica, de classe, das palavras e das ações. Mesmo as metáforas bélicas, utilizadas para atingir objetivos comunitários ou empresariais, devem ser definitivamente banidas do dicionário da cultura da paz, pois o ponto de partida dessa cultura é a cooperação entre a comunidade dos seres vivos e o desenvolvimento interior das pessoas.

Já é o momento de se criar nas escolas amplos programas de cultura da paz, para formar uma nova geração de pacifistas, que saiba dialogar, negociar, argumentar e cooperar a partir de relações de amor com as pessoas. Verdadeiros agentes e mediadores da paz. Algumas experiências já em curso devem ser destacadas. O Instituto Palas Athena tem sido um ponto de referência decisivo para inspirar valores da cultura da paz no país, particularmente em São Paulo. O programa Gandhi e a Não-violência, dessa instituição, visa subsidiar educadores com experiências de resolução de conflitos e mostrar como o diálogo pode ser instrumento de convivência. Junto à Polícia Militar de São Paulo, à Polícia Civil e aos integrantes dos Conselhos Comunitários de Segurança Pública (Consegs), desenvolve o concurso Gandhi e a Não-violência que consiste na elaboração de uma redação que relacione não-violência e segurança pública tendo como base o pensamento de Gandhi.
A Paz Pede Parceiros reúne voluntários, artistas, professores e monitores em espaços públicos para realizar várias atividades baseadas na simplicidade voluntária, na cidadania responsável, na ética solidária e na valorização das diferenças. Por exemplo: dança sagradas e da paz, caminhada silenciosa, jogos cooperativos, expressões dos jovens etc.

A Aliança por um Mundo Responsável, Plural e Solidário, a Rede Mundial de Artistas e o Instituto Pólis têm realizado Conversas de Rua sobre a paz em diversos pontos da cidade de São Paulo. Trata-se de uma atividade que envolve a população em um diálogo sobre vários temas, todos destacando a arte como fator de união e estímulo. Da mesma Aliança, o projeto Tambores pela Paz tem feito soar a convergência e a solidariedade em muitos pontos do planeta. Em 21 de junho do ano passado, a Aliança estimulou e participou diretamente dos Tambores pela Paz: na África (através da Caravana Africana pela Paz), em Barcelona, na França, no Brasil (em todas as regiões da cidade de São Paulo, além de Maceió, Brasília e Rio de Janeiro). Os eventos artísticos simbólicos que podem reproduzir o imaginário da paz são muito importantes para criarmos um clima favorável ao surgimento dessa cultura.

Em São Paulo, no ano passado, a prefeitura realizou, com a coordenação da Aliança, o Psicodrama

da Cidade, em 150 pontos do município. A idéia era desenvolver uma escuta da população sobre seus principais problemas, desafios e conflitos, e sugerir soluções.

O Fórum em Defesa da Vida, que reúne centenas de entidades da zona sul de São Paulo, tem realizado caminhadas públicas, ações nas escolas, denúncias etc. e tem se constituído em verdadeiro ponto de referência da cultura da paz para os movimentos sociais e a sociedade civil. Além de desenvolver atividades entre os estudantes e estimular o compromisso de professores e integrantes da polícia comunitária.

Mas vamos a outra chave para a criação de uma cultura da paz: a generosidade. Estamos, cada vez mais, perdendo a nossa capacidade de dar-se; encapsulados em nós mesmos, nos fechamos muito para os outros. Freqüentemente não temos valores próprios suficientes nem mesmo tempo para celebrarmos o outro. Justificamos tudo pelo medo, pela pressa, pela vida louca nas grandes cidades, esse compartilhar pouco o mundo cotidiano. Fico perplexo ao ver jovens cruzarem colegas ou professores na universidade, após conviverem juntos durante um semestre, e não celebrarem um bom-dia, a sociabilidade mínima do dia-a-dia. Felizmente o mundo ainda tem exemplos de generosidade: as mães, os seguidores de Gandhi, as pessoas espiritualizadas, aquelas de bom coração, pessoas comuns que encontramos diariamente, muitas ONGs, o trabalho voluntário, que se solidariza com os mais carentes e busca construir a paz, e muitos outros.

A educação deve preocupar-se em ensinar o jovem e a criança a dedicar parte do seu tempo e

de seus recursos materiais ao cultivo da generosidade. Félix Guattari no seu último artigo, “Por uma refundação das práticas sociais”, propunha para a sociedade futura uma redefinição do tempo: um destinado à reprodução da vida material e outro à economia dos valores sociais e mentais.

Mas nada disso se tornará possível sem diálogos. O mundo está carente de escutas e diálogos. Mais ainda que dialogar necessitamos “interculturar”, ou seja, crescer através do diálogo com a diversidade, com a vivência, a visão de mundo e a razão dos outros. O nosso grande desafio é viver junto: conviver. “O futuro da Bósnia não é a tolerância, mas a convivência”, disse em Barcelona o prefeito de Sarajevo.

É muito limitado para superarmos o paradigma da cultura da violência pensarmos nos termos tolerância X intolerância. Quando toleramos não compreendemos nem compartimos. Portanto, a nossa educação deve-se voltar para nos ensinar a ser conviventes e não apenas tolerar. Uma cultura forte se constrói na dialogia, e é por isso que não há cidadania sem uma escuta das diferenças culturais. Um novo paradigma educacional terá que ser criado a partir da diversidade cultural e da escuta.
Na escola e na vida é necessário escutar silêncios, gestos, olhares, toques; eles podem nos dizer mais do que todos os discursos racionalmente bem articulados e retoricamente impecáveis.
Devemos nos empenhar em desconstruir o discurso monolítico do saber no interior das escolas, o autoritarismo de certo saber oficializado. Grande parte dos nossos professores ainda vive um mundo autoritário, de saberes formais e indiscutíveis.

O saber do futuro será multicultural, isto é, se complementará no outro, e ampliará a condição

humana. Estabelecer trocas entre diferentes é uma chave para a formação: assim diminuímos nosso etnocentrismo e podemos ter visões e soluções que nos acrescentem humanidade. O jovem, por exemplo, pode conhecer jovens de outras escolas, da comunidade, participar de festividades de culturas diferentes, assistir a outros cultos religiosos, visitar quilombos e aldeias indígenas, ouvir estórias ancestrais e gêneros musicais novos, ampliando, assim, sua compreensão da pluralidade e seu repertório de valores humanos. Considero equivocado ensinar a criança e o jovem a manipular instrumentos tecnológicos sem contextualizá-los num cenário de vivências. Fala-se muito em inclusão digital, importante sem dúvida, mas ela não pode ser isolada dos contextos existenciais, vivenciais, presenciais da condição humana, sob o risco de prepararmos o jovem para o mundo tecnológico, mas não para um mundo mais humano.

Com a globalização vivemos a interdependência. A realidade e a ação não são mais globais, mas “glocais”, ou seja, locais e globais. O local é inseparável do global. Somos uma parte do todo. A metáfora do mundo não é mais a máquina, mas o holograma, como diz o físico Fritjof Capra (de holos, “todo” em grego), ou seja, em cada parte está o todo. A idéia de preservar o nosso planeta deve ganhar força com a educação. Devemos trabalhar para a formação de uma cultura planetária consciente dos desequilíbrios do planeta e das soluções micro e macroecológicas, locais e globais.
Finalmente, nesse mar de egoísmo e individualismo, encontramos a solidariedade. Esse é um tema importante nesta virada de milênio. Devemos educar as novas gerações para recompor laços de solidariedade: nas relações entre os sexos, entre pais e filhos, professores e alunos, comunidade e escola, diretoria e corpo docente, idosos e jovens, a solidariedade inter-geracional etc. A solidariedade deve se expandir para outras espécies, animais e vegetais. Hoje existe um amplo movimento mundial pela solidariedade humana e com os animais e vegetais. Não há mudança possível sem perceber que pertencemos a uma espécie que deve se solidarizar com a vida. Para tanto necessitamos mudar a visão antropocêntrica que nos coloca como reis, ou melhor, como déspotas absolutos da natureza, e desenvolver, então, uma visão em que o centro de tudo seja a vida e na qual tudo comece pelo direito a ela.

Destaco aqui o papel das mulheres nessa mudança de paradigmas: a afirmação dos valores femininos e da natureza feminina da alma humana pode nos trazer uma nova percepção do mundo e da vida. Somos herdeiros do patriarcalismo, que domina a natureza, e precisamos agora buscar novos diálogos e novos laços de solidariedade.

Um grande lema para o novo milênio será o de feminilizar o planeta.

Mahatma Gandhi e a Cultura da Paz

Pretendo terminar essas reflexões com algumas passagens de Mahatma Gandhi, guia espiritual da nova educação, que tem por finalidade a criação da cultura da paz.

Vamos nos iluminar:

“A força da não-violência é infinitamente mais maravilhosa e sutil que as forças materiais da natureza, como a eletricidade.”

 “A não-violência não consiste em renunciar a toda luta contra o mal. A não-violência, como eu a concebo, é, ao contrário, uma luta contra o mal mais ativa e mais real que a da lei de Talião, cuja natureza própria é desenvolver, com efeito, a perversidade.”

“Onde houver conflito, onde houver oposição, triunfe através do amor.”

“O mundo não é totalmente governado pela lógica: a própria vida envolve certa espécie de violência, e a nós compete escolher o caminho da violência menor.”

 “A força gerada pela não-violência é infinitamente maior do que a força de todas as armas inventadas pela engenhosidade do homem.”

 “O seu inimigo se renderá não quando sua força se esgotar, mas quando o seu coração se negar ao combate.”
“A única coisa que as nações do Ocidente ensinaram ao mundo, com as letras de fogo, foi que a violência não leva nem à paz nem à felicidade. O cultivo da violência não tornou felizes, nem melhores, as nações com quem entrou em contato.”

Penso que essas passagens da obra de Gandhi falam por si. O estudo do pensamento de Gandhi torna-se no mundo contemporâneo, marcado pela violência generalizada, um manancial de valores e de vivências que pode nos iluminar e despertar o amor pelo próximo, chave da cultura da paz. Precisamos mais do que nunca de um mundo não só materialmente farto mas também espiritualmente rico, não-mercantilizado, cheio de gratuidades, um mundo mitologizado, um mundo de muitas cores e poeticamente habitável. Um mundo de pessoas educadas desde o berço, não para a competição desenfreada e o desenvolvimento material, mas para o crescimento interior e a CULTURA DA PAZ.


     Hamilton Faria é poeta, autor, entre outros livros, de Súbitos Encantos para São Pedra Espanto. Professor titular da Faculdade de Artes Plásticas da FAAP e coordenador da área de cultura do Instituto Pólis. Participa da Aliança por Um Mundo Responsável e Solidário e é animador da Rede Mundial Artistas em Aliança.

Revelando São Paulo Capital – Setembro de 2008 no Memorial da América Latina (Barra Funda) durante Cerimônia pela Paz e pela Vida.

3 – Movimentos

Água: vida ou mercadoria?

 Leonardo Boff – Teólogo

De quarta-feira de cinzas até a páscoa milhões de católicos pelo pais afora estarão refletindo sobre o tema da Campanha da Fraternidade deste ano: “água, fonte de vida”. Além de sua missão evangelizadora, a Igreja está assim reforçando a cidadania, pois ensina seus fiéis a pensar coletivamente e a se responsabilizar por um bem vital que é a água. O livreto distribuído aos milhares, além de dados sobre a questão, oferece subsídios espirituais e éticos bem fundados e apresenta indicações práticas de como cuidar da água. Nossos melhores especialistas como Aldo da Cunha Rebouças são ai arrolados. Vejamos os principais dados e o conflito de base que envolve a questão da água.

Há quinhentos milhões de anos, a quantidade de água é praticamente constante. 70% da superfície da Terra é coberta de água: 97,6%, salgada e apenas 2,4%, doce. Desta minguada porcentagem, 70% se destina à irrigação, 20% à indústria e somente 10% ao consumo humano. Entretanto, apenas 0,7% dos 10% é imediatamente acessível, o restante está nos aqüíferos profundos, nas calotas polares ou no interior das florestas. A renovação das águas é da ordem de 43.000 km cúbicos por ano descarregados nos rios enquanto o consumo total é estimado em 6.000 km cúbicos por ano. Há muita água mas desigualmente distribuída: 60% se encontra em apenas 9 países, enquanto 80 outros enfrentam escassez. Pouco menos de um bilhão de pessoas consome 86% da água existente enquanto para 1,4 bilhões é insuficiente e para dois bilhões, não é tratada, o que gera 85% das doenças.

O Brasil é a potência natural das águas, com 13% de toda água doce do Planeta perfazendo 5,4 trilhões de metros cúbicos. Mas é desigualmente distribuída: 70% na região amazônica, 15% no Centro-Oeste, 6% no Sul e no Sudeste e 3% no Nordeste. Apesar da abundância, não sabemos usar a água, pois 46% dela é desperdiçada, o que daria para abastecer toda a França,a Bélgica, a Suíça e o Norte da Itália. É urgente, portanto, um novo padrão cultural.

Dois problemas têm criado o “estresse mundial da água”: sua sistemática poluição associada à destruição da biomassa que garante a perpetuidade das águas correntes e a falta generalizada de cuidado no uso da gota d’água disponível. Ensina Aldo Rebouças: é mais importante saber usar a gota d’agua disponível do que ostentar sua abundância. Por ser um bem escasso, nota-se corrida desenfreada à posse privada da água doce. Quem controla a água controla a vida. Quem controla a vida detém o poder.

Surge então o dilema: a água é fonte de vida ou fonte de lucro? É um bem natural, vital e insubstituível ou um bem econômico e uma mercadoria? Os que apenas visam lucro, a tratam como mercadoria. Os que pensam a vida, a veem como um bem essencial a todos os organismos vivos e ao equilíbrio ecológico da Terra. Direito à vida implica direito à água potável gratuita. Mas porque há custos na captação, tratamento, distribuição, uso, reuso e conservação, existe inegável dimensão econômica. Mas esta não deve prevalecer sobre o direito, antes, torná-lo real e garantido para todos.

Água doce é mais que recurso hídrico. É vida com todas as suas ressonâncias simbólicas de fecundidade, renascimento e purificação. Isso tem imenso valor mas não tem preço. Se houver cuidado ela será abundante para todos.

“O que sabemos é uma gota, o que ignoramos é um oceano.”

Isaac Newton

O Manifesto de Sevilha sobre a Violência

Espanha, 1986.

Posteriormente adotado pela UNESCO na 25ª Sessão da Conferência Geral em 1989.

Acreditando ser nossa responsabilidade como pesquisadores de diversas disciplinas tratar da questão da violência e da guerra, reconhecendo que a ciência é um produto cultural humano que não pode ser definitivo nem exaustivo, e gratos pelo apoio das autoridades de Sevilha e dos representantes da UNESCO espanhola, nós, abaixo assinados, professores do mundo todo e autoridades nos ramos científicos pertinentes, nos reunimos e chegamos a este Manifesto sobre a Violência. Nele questionamos certos assim chamados achados da biologia que têm sido usados, até mesmo por algumas de nossas especialidades, para justificar a violência e a guerra. Pelo fato destes ditos “achados” terem provocado uma atmosfera de pessimismo em nosso tempo, propomos que a rejeição aberta e ponderada dessas descobertas equivocadas poderá contribuir significativamente para o Ano Internacional da Paz.

O mau uso de teorias e informações científicas para justificar a violência não é algo novo, e vem ocorrendo desde o advento da moderna ciência. Por exemplo, a teoria da evolução foi usada não só para justificar a guerra, mas também o genocídio, o colonialismo e a supressão dos mais fracos.

Nosso ponto de vista é exposto aqui na forma de cinco proposições. Temos consciência de que há outros aspectos sobre a violência e a guerra que também poderiam ser abordadas produtivamente do ponto de vista de nossas disciplinas, porém restringimo-nos àquilo que consideramos um primeiro passo de importância fundamental.

É cientificamente incorreto

dizer que herdamos uma tendência a fazer guerra de nossos ancestrais animais. Embora lutas ocorram em todo o reino animal, apenas alguns poucos casos de luta destrutiva intra-espécies entre grupos organizados já foram descritos em espécies que vivem no seu ambiente natural, e nenhum destes casos envolve o uso de ferramentas construídas para serem armas. O comportamento predatório de alimentar-se de outras espécies não pode ser equiparado com violência intra-espécies. A guerra é um fenômeno especificamente humano e não ocorre em outros animais.

O fato de que a guerra mudou tão radicalmente ao longo do tempo indica que é um produto cultural. O elo da guerra com a biologia se estabelece fundamentalmente através da linguagem, que possibilita a coordenação de grupos, a transmissão da tecnologia e o uso de ferramentas. A guerra é biologicamente possível, mas não inevitável, como demonstrado pela variação de sua natureza e freqüência dentro do tempo e do espaço. Há culturas que não se envolveram na guerra durante séculos, e há culturas que estiveram em guerra freqüentemente em alguns períodos e não em outros.

É cientificamenete incorreto

 dizer que a guerra, ou qualquer outro comportamento violento, é geneticamente programado na natureza humana. Embora os genes estejam envolvidos em todos os níveis do funcionamento cerebral, eles oferecem um potencial de desenvolvimento que só pode ser concretizado em conjunto com o meio ecológico e social. Embora a predisposição individual para ser afetado pela experiência seja variável, é a interação entre o potencial genético e as condições do crescimento que determinam a personalidade. Exceção feita a raras patologias, os genes não produzem indivíduos necessariamente predispostos à violência. Tampouco determinam o oposto. Embora os genes estejam co-envolvidos no estabelecimento de nossas capacidades comportamentais, eles não determinam o resultado por si sós.

É cientificamenete incorreto

dizer que no curso da evolução humana houve uma seleção de comportamentos agressivos mais

do que de outros tipos de comportamento. Em todas as espécies que foram bem estudadas, o status dentro do grupo é atingido pela habilidade de cooperar e preencher certas funções sociais relevantes à estrutura daquele grupo. A “dominância” envolve laços e afiliações sociais, não sendo meramente uma questão de possuir e usar maior força física, embora envolva comportamentos agressivos. Em casos onde a seleção genética de comportamentos agressivos foi instituída artificialmente em animais, conseguiu-se produzir rapidamente espécimes hiper-agressivos, o que demonstra que em condições naturais a agressividade não foi prioritariamente selecionada, visto que não produziu o mesmo efeito. Quando estes animais hiper-agressivos produzidos em laboratório são introduzidos no grupo social, eles desagregam a estrutura social, ou então são expulsos. A violência não está em nosso legado evolutivo, nem em nossos genes.

É cientificamenete incorreto

dizer que os humanos têm um “cérebro violento”. Embora tenhamos o aparato nervoso para agir violentamente, esta reação não é automaticamente ativada por estímulos internos ou externos. Como os primatas superiores, e diferente de outros animais, nossos processos neurais superiores filtram tais estímulos antes que possamos agir em resposta. A forma como agimos é determinada pelo modo como fomos condicionados e socializados. Não há nada em nossa neurofisiologia que nos obrigue a reagir violentamente.

É cientificamenete incorreto

dizer que a guerra é causada por “instintos” ou por qualquer motivação isolada. O surgimento da guerra moderna foi uma história que nos levou da supremacia de fatores emocionais e motivacionais, por vezes chamados “instintos”, até a supremacia de fatores cognitivos. A guerra moderna envolve o uso institucional de características pessoais como a obediência, a sugestionabilidade, o idealismo, habilidades sociais como a linguagem, o uso de raciocínios como o cálculo de custos, planejamento e processamento de informações. A tecnologia da guerra moderna vem exacerbando tendências relacionadas à violência, tanto no treinamento de combatentes em si como também na preparação de apoio à guerra por parte da população em geral. Como resultado dessa exacerbação, tais tendências muitas vezes são tidas erroneamente como causas ao invés de conseqüências do processo.

Concluímos que a biologia não condena a humanidade à guerra, e que a humanidade pode ser libertada da opressão do pessimismo biológico e empoderada com confiança para realizar as transformações necessárias nesse Ano Internacional da Paz e nos anos que se seguirão. Embora essas tarefas sejam principalmente institucionais e coletivas, dependem também da consciência individual dos participantes, para quem pessimismo ou otimismo são fatores cruciais. Assim como “as guerras começam na mente dos homens”, a paz também começa na nossa mente. A mesma espécie que inventou a guerra é capaz de inventar a paz. A responsabilidade é de cada um de nós.

Sevilha, 16 de Maio de  1986

  • David Adams, Psicologia, Wesleyan University, Middletown, CT., Estados Unidos.
  • S.A. Barnett, Etologia, The Australian National University, Canberra, Austrália
  • N.P. Bechtereva, Neurofisiologia, Institute for Experimental Medicine of Academy of Medical Sciences of the U.S.S.R., Leningrado, Rússia.
  • Bonnie Frank Carter, Psicologia, Albert Einstein Medical Center, Philadelphia (PA), Estados Unidos.
  • José M. Rodriguez Delgado, Neurofisiologia, Centro de Estudios Neurobiologicos, Madri, Espanha
  • José Luis Diaz, Etologia, Instituto Mexicano de Psiquiatria, Mexico D.F., Mexico
  • Andrzej Eliasz, Psicologia das Diferenças Individuais, Polish Academy of Sciences, Varsóvia, Polônia
  • Santiago Genovés, Antropologia Biológica, Instituto de Estudios Antropologicos, Mexico D.F., Mexico
  • Benson E. Ginsburg, Genética do Comportamento, University of Connecticut, Storrs, CT., Estados Unidos
  • Jo Groebel, Psicologia Social, Erziehungswissenschaftliche Hochschule, Landau, Alemanha
  • Samir-Kumar Ghosh, Sociologia, Indian Institute of Human Sciences, Calcutá, Índia
  • Robert Hinde, Comportamento Animal, Cambridge University, Cambridge, Reino Unido.
  • Richard E. Leakey, Antropologia Física, National Museums of Kenya, Nairobi, Quênia
  • Taha H. Malasi, Psychiatry, Kuwait University, Kuwait
  • J. Martin Ramirez, Psychobiology, Universidad de Sevilla, Spain
  • Federico Mayor Zaragoza, Biochemistry, Universidad Autonoma, Madrid, Spain
  • Diana L. Mendoza, Ethology, Universidad de Sevilla, Spain
  • Ashis Nandy, Political Psychology, Centre for the Study of Developing Societies, Delhi, India
  • John Paul Scott, Animal Behavior, Bowling Green State University, Bowling Green, OH., U.S.A.
  • Riitta Wahlstrom, Psychology, University of Jyväskylä, Finland

 

3- Deus é Maior que nossos corações… (*)

              “O que nos une é mais forte que o que nos separa!”   Paulo de Tarso, o apóstolo  

As dificuldades de respeito ao outro, em suas /nossas diferenças, é uma situação dos adultos.

Por outro lado, se não interferirmos as crianças serão, sempre, naturalmente mais acolhedoras que nós. Não reconhecerão impedimentos. Falarão com seus amiguinhos, brincarão com eles, comungarão, mesmo que contrariando as motivações dos adultos. Brincarão através das cercas. (Não nos esqueçamos dos muitíssimos flagrantes de crianças judias e palestinas, e de outras etnias, brincando e se comunicando “livres através dos muros”). Não reconhecerão limites.

As crianças que dormitam em nosso interior de pessoas adultas, também.

Em novembro de 2005 participei de um retiro trans-religioso, no sítio da Brahma Kumaris, em Serra Negra. Nós, cerca de 30 adultos, com formações, trajetórias de vida e práticas religiosas as mais diversas, nos exercitávamos, como temos buscado fazer nos últimos tempos, no aprender a ouvir para compreender, no compartilhar. Nos exercitávamos na busca do entendimento.

Duas crianças, meninas, de cerca de 8 e 10 anos, uma judia e outra espiritualista, acompanharam seus pais. Estiveram juntas o tempo todo, sem a menor dificuldade, ou com disposição para transpô-las. Sem o menor esforço. Brincaram, mas, sobretudo em muitos momentos nos deram lições.Foram capazes de dar depoimentos sobre as práticas devocionais a que estavam acostumadas quando em seus aconchegos, e de um existir franco, para além de barreiras e preceitos.

De nossa parte, reconhecendo que muito da violência que se pratica no mundo, de há muito, tem sua motivação na intolerância gerada, e alimentada, no seio das religiões e das culturas, temos nos preocupado, com abnegação, em descobrir ou construir o caminho de uma cultura de paz que nos possibilite reconhecer em nossas diferenças a riqueza da diversidade e, quando for o caso, o encontro de soluções pacíficas para os conflitos, estimulando a reconciliação através do exercício da compaixão e sabedoria superior, do despertar nossas verdades profundas e da manifestação do amor e justiça.

Aquelas duas crianças ensinaram-nos, tão de pronto, a lição essencial que temos buscado praticar nos Círculos de Cooperação Inter Religiosa, qual seja o reconhecimento imediato de que “o que nos une é mais forte que o que nos separa”; que é assim possível a pessoas de diversas religiões, expressões espirituais e tradições indígenas ser companheiras no compartilhar da vida na terra, com justiça e verdade, sem julgar ou tomar partido, em clima de solidariedade, compaixão e amizade profunda.

E que as crianças cantem livres sobre os muros
E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor
E que o passado abra os presentes pro futuro
Que não dormiu e preparou o amanhecer…

(Taiguara)

Já de um tempo a humanidade vem buscando construir o caminho da convivência harmoniosa entre os semelhantes e com toda a manifestação da vida em nossa comunidade terrestre.

Esta necessidade foi ganhando forma ao longo da 2ª metade do séc. 20, encorpando-se na década de 90, durante o Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade (1), patrocinado pela UNESCO no Convento da Arrábida, em Portugal. Durante o mesmo, uma comunidade de pensadores, ali reunida, reconhecendo-se nas buscas empreitadas ao longo dos tempos, elaborou e subscreveu, comprometendo-se colocá-la em prática, a Carta da Transdisciplinaridade (2), um contrato moral que todo signatário fez consigo mesmo, livre de qualquer espécie de pressão jurídica ou institucional.

O documento reúne um conjunto de princípios fundamentais da comunidade de espíritos transdisciplinares, dirigindo-se aos seres humanos de todos os países. Sim, sem distinção, a todos os seres humanos que se dispõem a integrá-la, mesmo que ainda em construção, não se limitando ao âmbito acadêmico.

Espíritos transdisciplinares podem se considerar quaisquer pessoas interessadas em medidas progressivas de ordem nacional, internacional e transnacional, e na aplicação das mesmas em suas vidas, no dia a dia.

Pode se considerar também, todo aquele que reconhece não existir um lastro cultural privilegiado, a partir do qual seja possível julgar as outras culturas; aquele que busca cultivar um enfoque transcultural, que conduz a uma atitude aberta em relação à religiosidade, aos mitos, às religiões e temas afins, bem como na consideração de temas desconhecidos até então.

Que reconhecer que a abertura pressupõe a aceitação do desconhecido, do inesperado e do imprevisível e, por isto, exercitar-se diuturnamente na difícil assimilação do direito do outro a idéias e verdades diferentes das suas.

 Ainda todo aquele que reconhece em cada ser humano um ser transnacional, com direito a uma nacionalidade, mas transbordando-se no reconhecimento da Terra como pátria, um direito internacional dessa dupla condição – pertencer a uma nação e à Terra. “A dignidade do ser humano também é de ordem cósmica e planetária. O aparecimento do ser humano na Terra é uma das etapas da história do universo.”

Nas discussões preliminares à elaboração da Carta da transdisciplinaridade foram considerados, entre tantos, os seguintes desafios:

  • a dimensão planetária dos conflitos atuais;
  • a complexidade do nosso mundo e o desafio contemporâneo de autodestruição material e espiritual da nossa espécie;
  • a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais cumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido e as conseqüências daí oriundas;
  • a constatação que o crescimento dos saberes, sem precedente na história, aumenta a desigualdade entre os que os possuem e os que deles estão desprovidos, gerando similarmente uma desigualdade crescente no seio dos povos e entre as nações do nosso planeta. Entretanto, apesar da gravidade de todos os desafios enunciados, foi considerado também que, numa contrapartida de esperança, o crescimento extraordinário dos saberes pode conduzir, a longo prazo, a uma mutação comparável à passagem dos hominídeos à espécie humana.

Ao conclamar toda a humanidade ao desenvolvimento de uma comunidade de espíritos transdisciplinares, transculturais, transnacionais, transpessoais,…transreligiosos, a Carta com uma visão completamente aberta, capaz de estabelecer um espaço para o diálogo pleno e franco entre todas as pessoas, entre suas práticas e vivências, instiga a humanidade a uma nova forma de relacionamento. A busca desta visão transdisciplinar, focada na complexidade, pode significar uma nova abordagem da vida na Terra, de nosso viver neste planeta, como nos aponta de modo exemplar Basarab Nicolescu, um dos mais atuantes e respeitados físicos teóricos no cenário científico:

O compartilhar universal do conhecimento não poderá ocorrer sem o surgimento de uma nova tolerância fundada na atitude transdisciplinar, a qual implica colocar em prática a visão transcultural, transreligiosa, transpolítica e transnacional; visto a relação direta entre paz e transdisciplinaridade.”

A ética transdisciplinar recusa toda e qualquer atitude que rejeite o diálogo e a discussão, qualquer que seja a sua origem – de ordem ideológica, científica, religiosa, econômica, política, filosófica. O saber compartilhado deve levar a uma compreensão compartilhada, fundamentada no respeito absoluto às alteridades unidas pela vida comum numa só e mesma Terra.

Não é demais frisar que a transdisciplinaridade, em que pese todo seu aporte acadêmico, se apresenta como uma nova postura, uma nova forma de olhar o mundo, não se circunscrevendo, assim, ao universo dos estudos, das abstrações, mas atenta ao viés de sua aplicação e das formas possíveis por onde fazê-lo.Mais que uma teoria, como nos mostra Paulo Afonso Roncanos:

É uma abordagem íntima, uma postura. É estado de espírito, uma espécie de peripécia da mente que precisa ser assimilada e vivida pelos que ensinam, aprendem ou trabalham. É uma habilidade que só se concretiza quando se tece um vínculo sincrônico e contínuo entre os saberes. “Ela está ligada tanto a uma nova visão como a uma experiência vivida. É um caminho de auto-transformação orientado para o conhecimento de si, para a unidade do conhecimento e para a criação de uma nova arte de viver”.

Falamos em transdisciplinaridade, transreligiosidade e não em ecumenismo e inter-religiosidade.(3) O Ecumenismo corresponde à perspectiva inter-disciplinar, e o que se vem buscando no campo da inter-religiosidade no presente- um diálogo franco e irrestrito entre todos os segmentos religiosos –  sintoniza-se perfeitamente com o pretendido pela transdisciplinaridade.

Entretanto ao se falar em transcultura, transnação e transreligião, não se está propondo, em momento algum, que se negue as culturas, as nações e as religiões ou mesmo a riqueza singular do indivíduo. Ao contrário, está se propondo que cada cultura, cada nação e cada religião mergulhe cada vez mais em si mesma, exercitando-se no respeito pelas outras. Procurando mais que preservar sua identidade, expandi-la. Desse modo os princípios comuns que estão por trás da diversidade emergirão. Poderão aflorar então o verdadeiro diálogo, o verdadeiro respeito, a verdadeira paz. A paz ativa pela qual Gandhi deu a vida.“O que nos une é mais forte do que o que nos separa”, não nos esqueçamos!

A experiência humana, em todos os tempos sempre procurou exprimir um “algo” de outra ordem que é ‘um mais’ tanto na base como no fim de tudo o que somos, sem excluir ninguém.( Panikkar)

No tangente às vivências espirituais da humanidade não temos dúvida de que a atitude transdisciplinar seja o caminho que pode nos conduzir a uma tão grande liberdade interior que nos possibilite um “olhar liberto” e a uma palavra igualmente libertada, contribuindo para uma nova e mais profunda compreensão de nossa realidade espiritual, mais além dos sectarismos, sem reconhecer “…a nenhuma tradição humana, igreja, religião ou ciência, o monopólio de Deus, …sem torná-lo prisioneiro de uma ideologia seja ela qual for”, como  nos ensina Raimon Panikkar (4), esse espírito transdisciplinar por excelência.

Somente ao nos libertarmos dos sectarismos de todo tipo, é que conseguiremos compreender que, ao contrário, Ele, Deus, é o mesmo Deus da humanidade inteira, e quer o bem para todos, igualmente, e que a ninguém foi dado o privilégio de querer sua posse. Somente depois de abandonarmos a necessidade de nele projetar nossos desejos insatisfeitos (na verdade um deus construído pelo homem, uma caricatura de Deus), é que conseguiremos transitar por esse universo complexo que é a espiritualidade humana:

Não podemos ‘compreender’ ou significar o que a palavra ‘Deus’ representa na óptica de uma única perspectiva ou mesmo a partir de um único princípio de inteligibilidade. Na verdade nem a palavra ‘Deus‘ é necessária.Toda a tentativa para tornar absoluto o termo ‘Deus‘ destrói as ligações não só com mistério divino (que deixaria assim de ser absoluto – isto é sem dependência relacional de qualquer espécie), mas com os homens e com as mulheres daquelas culturas que não sentem a necessidade deste símbolo. (Panikar) (5)

Em verdade nem precisamos falar de Deus. Precisamos, sim alcançar um grande silêncio interior para permitir que Ele se manifeste em nós, aflore em cada um de nós, em todos nós.Permitir que ele se manifeste através de cada um de nós:

(…) Nascemos para manifestar a glória

Do Deus que existe em nós.

Não em alguns de nós, mas em todos nós.

Quando deixamos que a nossa luz brilhe,

Inconscientemente damos ao próximo

Permissão para fazer o mesmo.

Quando nos libertamos de nossos medos,

Nossa presença, automaticamente,

Liberta os semelhantes.

(A return to Love – Marianne Williamsom)

Bom será que um dia, e que este venha breve, possamos chegar a nos sentir como Gandhi, quando declara

“A minha vida é um Todo indivisível, e todos os meus atos convergem uns nos outros; e todos eles nascem do insaciável amor que tenho para com toda a humanidade”.

Que possamos, então, muitas vezes, a cada dia, nos determos diante de cada criaturaem reverência sincera, sentindo , mais que falando- Namasté ! Minha essência saúda a tua essência. O Deus que habita, em mim saúda o Deus que habita em ti.

Toninho Macedo

Durante o verão de 2006

  (*) Artigo publicado no número dedicado às ciências da religião, da Revista Uniclar das Faculdades Integradas Claretianas –  São Paulo – Julho de 2006

1-Convento da Arrábida, Portugal, 2 a 7 de novembro de 1994.- http://www.unipazrj.org.br/carta.htm

2- A transdisciplinaridade não é um simples conjunto de conhecimentos ou um novo modo de organizá-los. Trata-se de uma postura de respeito pelas diferenças culturais, de solidariedade e integração à natureza.É o reconhecimento da interdependência de todos os aspectos da realidade, encurtando a distância entre a ciência, a cultura e a vida, e entre o trabalho acadêmico e o benefício público. Tem a ver com a vida das pessoas em um mundo cada vez mais complexo. Uma busca necessária para manter (ou recuperar) o homem integral. A fragmentação do conhecimento acaba sendo um instrumento de dominação e como conseqüência, de exclusão.

“Como o prefixo ‘trans’ indica, a transdisciplinaridade diz respeito ao que está, ao mesmo tempo, entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de todas as disciplinas. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, e um dos imperativos é a unidade do conhecimento.” (NICOLESCU, 1999)

Um bom endereço para os que quiserem se aprofundar nas discussões em torno do tema: http://www.sociologia.org.br/ap40.htm

3- O conceito de ecumenismo, por si só, dá conta do que é universal. E neste sentido deveria estar próximo, ou mesmo confundir-se, com o de transdisciplinaridade ou transreligiosidade. Chego mesmo a acreditar que esta idéia, este propósito, estivessem encarnados no âmago do Concílio Vaticano II. Entretanto, a partir do mesmo, o que se deu na prática foi o árido exercício do diálogo entre os 3 segmentos chamados monoteístas: Judeus,Cristãos e Muçulmanos. Não que isto pudesse ser pouco se consumado. Não que isto deva ser considerado pouco pelo seu simples ineditismo, impensável até então, e pelo que esta simples aproximação representou a partir de então.

4- Raimon Pannikkar (Barcelona 1918) padre católico e eremita hindu (filho de mãe espanhola e católica e de pai indiano e hindu), Doutor em Filosofia, Ciências e Teologia. Catedrátido de Filosofia Comparada da Religião na Universidade da Califórnia de 1972 a 1987. É um dos expoentes das relações interculturais, e defensor do diálogo entre pessoas, culturas e religiões. 

5- Para conhecer melhor Raimon Panikkar: Nove maneiras de como se não deve falar de Deus -Por Raimon Panikkar

http://panikkar.splinder.com – http://www.gianfrancobertagni.it/autori/raimonpanikkar.htm

http://www.aril.org/panikkar.htm  , http://aesmo.no.sapo.pt/panikkar.htm 

Convido todos para a leitura de Duas Parábolas recontadas (O Bom Samaritano) por Rubem Alves http://www.rubemalves.com.br/duasparabolasrecontadas.htm

Manifesto do Círculo de Cooperação Inter Religioso de S. Paulo

Carta apresentada na Cerimônia Inter Religiosa em comemoração aos 30 anos da Abaçaí Cultura e Arte- Parque da Água Branca –15 de Março de 2003

    Nós, pessoas de diversas religiões, expressões espirituais e tradições indígenas, membros da Iniciativa das Religiões Unidas, Círculo de Cooperação de São Paulo somos contra a guerra e contra qualquer forma de violência para resolver conflitos.  

Nosso propósito é promover a cooperação inter religiosa diária e constante a fim de terminar a violência motivada pelas religiões, criar culturas de paz, justiça e cura para a Terra e todos os seres vivos.
Nós nos unimos para criar locais seguros para a resolução de conflitos, cura e reconciliação.

Nos unimos para usar nossos recursos nas ações de não violência, de compaixão e sabedoria superior.

Nos unimos para despertar nossas verdades profundas e manifestar amor e justiça entre toda vida em nossa comunidade terrestre.

 Assim sendo, unidos estamos contra a guerra, pois não há nenhuma guerra santa ou justa. Todas as guerras são perversas e más. Todas as guerras trazem tristezas e separações entre pessoas, povos, países. Todas as guerras dizimam vidas humanas e a própria natureza. Os efeitos das guerras se alastram por todo o planeta e por todo universo por tempo incomensurável.

Urgentemente rogamos a todos os seres que se unam formando uma Rede de Paz, solidariedade, justiça, compaixão e amizade profunda.

Companheiros no compartilhar da vida na Terra, digam não à guerra.

Sem julgar ou tomar partido. Nós invocamos a paz, com justiça e verdade, no compartilhar da vida, para todos os povos e todas as áreas do planeta. No Brasil e no mundo.

 Em Paz, pela Paz.
 Círculo de Cooperação de São Paulo – CCSP
Iniciativa das Religiões Unidas – URI

15 de março de 2003

Felicidade nacional bruta

http://www.tseringpaldron.net/interdep.htm

Numa época em que todos os políticos do mundo fazem campanha com base nos índices de crescimento económico e de produto nacional bruto, há um país com um conceito radicalmente diferente. No Butão, o que conta é o FIB, a felicidade interna bruta.

O Butão é um país minúsculo, budista e com um fraco desenvolvimento económico. No ranking da ONU, ele aparece em 134º lugar de 177 países, em termos de desenvolvimento económico. Assim, observadores externos e índices económicos concordam em dizer que a população vive na miséria.

Abro um parêntesis para fazer aqui uma advertência: aquilo que os índices e os critérios ocidentais chamam de miséria não tem nada a ver com a apreciação do grau de felicidade das pessoas. Quem já viajou em países subdesenvolvidos poderá ter ficado surpreendido com o que encontrou. No meio da tal miséria as pessoas parecem felizes, despreocupadas e certamente muito menos stressadas do que nós. Mas voltemos ao FIB.

Foi o atual rei, Jigme Singye Wangchuk, que, nos anos setenta, afirmou que a felicidade interna bruta do seu povo o preocupava muito mais do que o PIB. Inicialmente a piada fez sorrir. Mas com os

 anos, esta ideia tem-se vindo a desenvolver.

O senhor Thinley, actual ministro do interior e antigo primeiro-ministro, teorizou a afirmação real. Segundo ele, o FIB apoia-se em quatro grandes pilares. O primeiro é o desenvolvimento sócio-económico justo e estável. O segundo, a preservação do meio ambiente. O terceiro, a preservação e a promoção da cultura e dos valores tradicionais. E o quarto, uma boa governação.

A nível do que um governo pode fazer pela felicidade do país, os quatro pilares do Thinley parecem-me relevantes. Justiça social e repartição da riqueza, são fundamentais para uma vida social saudável. Preservação do ambiente é vital. Estamos finalmente a dar-nos conta de que as políticas a curto prazo e o desrespeito pelo equilíbrio ambiental podem destruir o planeta e comprometer a nossa sobrevivência. Esperemos que não seja tarde demais!

Preservar a cultura e os valores tradicionais pode soar mal num mundo onde tudo está cada vez mais “globalizado” mas tem a sua importância, pelo menos eu acho. É certo que as tradições locais – romarias, celebrações, touradas, procissões, etc. – têm tendência para desaparecer. Essas formas estavam ligadas a um tempo, um espaço e uma forma de viver que mudaram radicalmente nas últimas décadas. Assim, é natural que essas formas se esvaziem de conteúdo e desapareçam. Mas isso não é o mais importante.

Em contrapartida, há coisas que nunca se tornam anacrónicas. OS valores humanos de dignidade, respeito, solidariedade e compaixão nunca deixarão de ser actuais nem se esvaziarão de conteúdo. Não gostam de ser bem tratados? Não gostam que vos sorriam? Não gostam que sejam honestos convosco? Eu gosto.

A pergunta é:

“Será que um governo pode fazer algo para preservar e promover este tipo de valores?”.

De acordo com a visão budista este é, essencialmente, um trabalho pessoal que cabe a cada indivíduo desenvolver sobre si próprio, de forma independente do ambiente social em que vive. Assim, quer o governo seja bom ou mau, comunista ou capitalista, esse trabalho é sempre possível.

No entanto, estamos todos de acordo que a maioria de nós não tem disponibilidade para reflectir sobre essas coisas e segue o movimento. Faz porque “se faz”, diz porque “todos dizem” e pensa porque foi ensinado a pensar assim. A esse nível, claro, um governo pode ajudar, fomentando uma mudança de mentalidades através de políticas e campanhas para a educação cívica da população, de todas as faixas etárias e particularmente dos jovens, claro. É que sem essa educação as nossas sociedades, por mais prósperas que sejam, continuarão a padecer de males profundos e irremediáveis e a ter um FIB baixíssimo.

O quarto pilar do senhor Tinley é a boa governação, ou seja, manter o equilíbrio entre os outros três, com honestidade, sentido cívico e sem ceder à corrupção.

Estamos longe desta utopia, não estamos?

Notícias do Butão (Felicidade Nacional)

 08/11/2005 02:08

Folha Online– 05 de Outubro, 2005

Um grupo de economistas japoneses defendeu recentemente que o seu país deveria preocupar-se menos com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e inspirar-se no exemplo do Butão, um pequeno reino dos Himalaias, que mede o seu progresso com base num outro tipo de indicador: a Felicidade Nacional Bruta (FNB).

“O Japão tem muito que aprender com o Butão nesta matéria“, afirmou Takayoshi Kusago, ex-economista do Banco Mundial e professor da Universidade de Osaka, durante o simpósio subordinado a este tema, organizado em Tóquio no início de Outubro.

Apesar de o PIB do Butão ser de apenas 500 milhões de dólares, quase nove mil vezes inferior ao do Japão (4,4 mil milhões de dólares), desde 1970 que o pequeno reino budista se preocupa sobretudo com o crescimento do índice que mede a felicidade individual dos cidadãos. A “FNB” leva em conta fatores como o desenvolvimento socio-econômico duradouro e equitativo, a preservação do meio ambiente, a conservação e promoção da cultura e a boa governação.

Em busca de um modelo de desenvolvimento, o Butão não encontrou qualquer índice que estivesse de acordo com os valores e aspirações do país, constatando que o mundo estava dividido entre nações ricas e em nações pobres”, explicou o economista butanês Karma Galay.

Os economistas japoneses admitem que no que diz respeito ao índice de FNB, os progressos do Butão são muito superiores aos do Japão, onde a taxa de suicídio é uma das mais elevadas do mundo e não raramente ocorrem mortes por excesso de trabalho.

Os economistas destacaram ainda o fato de as crianças do Butão serem praticamente especialistas em questões de meio ambiente, matéria que, na opinião de Shunichi Murata, professor da Universidade Kansei Gakuin, é “muito melhor do que se ensina geralmente aos meninos japoneses”.

4 –Um mundo novo é possível…

Reflexões e notícias

 Você pode mudar o mundo

Momentos decisivos

( Matéria publicada na revista Bons Fluídos, edição de Janeiro )

Clube de Budapeste

Você pode mudar o mundo. Esse é o lema de um movimento mundial para melhorar a vida no planeta, iniciado pelo Clube de Budapeste, uma associação humanista que reúne cientistas, escritores, empresários, líderes políticos e espirituais. O presidente do clube, o filósofo Ervin Laszlo, húngaro de 70 anos, esteve no Brasil, onde lançou o Prêmio Planeta Casa 2003, da revista Casa Claudia, e falou a Bons Fluidos sobre os desafios que enfrentaremos nesta década.  

Gente como o líder budista Dalai-Lama, o cantor inglês Peter Gabriel e o ex-presidente da União Soviética Mikhail Gorbachev fazem parte do Clube de Budapeste, criado para analisar as grandes questões mundiais que afetam a sobrevivência de cada um de nós e do planeta. Escassez de água e energia e desenvolvimento sustentável são temas de discussão permanente nesse clube, que tem propostas concretas para melhorar a qualidade de vida hoje e no futuro. Segundo Ervin Laszlo, presidente da entidade, nossas escolhas – como consumidores e cidadãos – nos próximos dez anos serão fundamentais para evitar o caos.

Bons Fluidos – O que está acontecendo com o mundo hoje?

Ervin Laszlo – Estamos num momento que chamo de macrotransição, um processo de mudança que ocorre em vários níveis ao mesmo tempo: em todos os países, na economia, na sociedade, no ambiente, na natureza. E o resultado é imprevisível. Pode ocorrer uma nova organização do sistema, melhor e mais sustentável. Ou um colapso, o caos, com o fim de muitas espécies e culturas.

BF – Em que ponto desse processo estamos agora?
 EL – É a primeira vez que o mundo enfrenta o fato de que não é sustentável. Quer dizer, não há recursos suficientes para todos. É só ver como o clima está mudando, como não há água potável nem comida para todos, como as doenças se alastram. O primeiro documento sobre isso foi elaborado em 1972 e já apontava que os recursos naturais não eram inesgotáveis. Mas só 30 anos depois estamos nos dando conta de que isso é real.

    BF – Por que esta primeira década do século 21 é crucial?
    EL – O tempo para mudar é muito curto, o colapso pode acontecer a qualquer momento – pode ser uma guerra nuclear ou a escalada do terrorismo, que é uma das manifestações do nível de estresse mundial. Há cinco, dez anos, não dava para imaginar que alguém estivesse disposto a fazer ataques como os de 11 de Setembro, nos Estados Unidos. As pessoas estão tão perturbadas e sentem tanta raiva que se dispõem a sacrificar suas próprias vidas para promover mudanças.

    BF – Qual é o papel dos valores espirituais em tudo isso?
    EL – Não estamos falando apenas de religião. Na verdade, são valores éticos e humanitários, que estão além do egoísmo e da ganância. Se você for uma pessoa espiritual, sabe que faz parte da natureza e, então, tem mais apreço por sua vida, mais noção de responsabilidade sobre o que faz. O que interessa é que você faz parte da criação e do Universo.

    BF – Como é possível incorporar esses valores no dia-a-dia?
    EL – Gandhi (líder pacifista indiano) dizia: “Seja a mudança que você quer ver no mundo”. Para ser uma pessoa mais profunda e mais responsável, dedique um tempo de seu dia para pensar em seu papel na vida e agir com mais consciência. Não dá para ter paz no mundo sem ter paz de espírito.

    BF – O senhor afirma que o planeta precisaria ter três vezes mais água e terra para dar conta das necessidades da população mundial. É possível reverter esse quadro?
    EL – Sim, porque as coisas podem mudar muito rapidamente. Graças aos sistemas de comunicação, o que se faz aqui afeta as pessoas do outro lado do mundo. Se for possível unir todos os movimentos positivos que surgem ao redor do globo, na prática o potencial de mudança será poderoso.

    BF – Essas mudanças positivas existem de fato?
    EL – Há um novo espírito, que está crescendo. Vejo gente de classes mais abastadas do mundo todo adotando um estilo de vida em que não se consome em excesso. Pois, pessoas muito pobres não podem ter esse tipo de preocupação. Mas, quando a sobrevivência está garantida, fica a critério de cada um decidir coisas simples, como reciclar ou não o lixo.

    BF – As organizações não-governamentais ajudam a mudar o mundo?
    EL – O problema é que existem ONGs demais. Milhares de organizações fazem coisas boas, mas sem força política e econômica suficiente porque não estão trabalhando juntas. Se agissem de maneira integrada, teriam mais influência.

    BF – Uma pesquisa recente feita nos Estados Unidos mostrou que a proteção à família é o que as pessoas mais valorizam nesse momento. O que o senhor acha disso?
    EL – Com tantas ameaças de ataques terroristas e instabilidade no emprego, é claro que a preocupação vai ser com a segurança pessoal. Mas é preciso tomar cuidado com pesquisas de opinião porque as pessoas dizem o que causa boa impressão. É preciso analisar em que tipo de políticos elas votam, que tipo de produto compram, como trabalham e como se relacionam. O que conta é ter mais consciência em cada atitude.

    BF – Qual nosso maior desafio?
    EL – É começar a viver de maneira que o planeta continue sustentável. Daqui a dez anos vamos estar vivos. Em 20 anos também. Mas, se não mudarmos o modo de fazer as coisas, se não tivermos mais consciência em nossas escolhas, quando nossos filhos e netos ficarem mais velhos, este planeta estará em um estado lamentável.

Novos valores

    “Cerca de 25% da população dos Estados Unidos já criou um estilo de vida baseado no cuidado e na consciência de que tudo no planeta está interligado. É o que apontam pesquisas realizadas recentemente. Diferentemente do que costumamos imaginar, não é pouca gente que está passando da cultura da cobiça e da escassez para outro tipo de cultura, baseada na suficiência e no cuidado, que são valores fundamentais para a sobrevivência do planeta”, afirma Ervin Laszlo, presidente do Clube de Budapeste, Ph.D. em ciências humanas pela Universidade de Sorbonne, na França, e autor do livro Macrotransição – O Desafio para o Terceiro Milênio (ed. Axis Mundi). Durante uma de suas palestras em São Paulo, o professor Laszlo citou os resultados da pesquisa americana e de outras duas que ainda não foram concluídas na Europa e no Japão. Elas mostram que, desde a década de 60 até o ano 2000, se delinearam três grupos de valores que norteiam atitudes e escolhas.

        . Modernistas são basicamente aqueles que querem ter dinheiro, carreira, status, casa grande. O que mais importa na vida é a eficiência e a velocidade. Trabalho e família são áreas de atuação totalmente separadas. Essa é a mentalidade dominante, pois é a mais difundida. Representa hoje cerca de 47% da população americana. Em 1960, era 45%.

     . Tradicionalistas são os que vivem em cidades menores, de formas bem tradicionais, com mais segurança e voltados para interesses comunitários. Em 1960, esse segmento representava 50% nos Estados Unidos. Hoje diz respeito a 30% da população, principalmente pessoas acima de 50 anos.

        . Criativos culturais expressam a nova cultura da suficiência e do cuidado. Em 1965, eram apenas 5% da população e hoje são 25%. Nos Estados Unidos, são 55 milhões de pessoas voltadas para valores mais humanitários. Segundo Ervin Laszlo, esse grupo é importante para a melhora da qualidade de vida individual e coletiva, pois está em sintonia com a preservação do planeta.

 Tem um perfil delineado com base em algumas características:

     . Acreditam que todos os aspectos da realidade e da sociedade estão conectados;

     . Querem criar uma integração entre a humanidade e a natureza;

     . Reconhecem que, sem cultivar valores espirituais, só lutamos uns contra os outros e nos desrespeitamos;

     . Estão buscando uma organização própria, localizada e também global;

    . Estão cultivando menos a competição e mais a conciliação de interesses e as parcerias (entre ramos de negócios, entre culturas, entre homens e mulheres, entre homem e natureza).

Onde jogar o óleo de frituras feitas em casa.     

                                    

Vanderlei Cordeiro de Lima

 Atleta de ouro – Homem de Paz

O perdão que valeu mais que o ouro olímpico 

 Todos viram este triste episódio no final das Olimpíadas de Atenas-2004.

Seria um feito inédito para o Brasil vencer a prova mais respeitada e aguardada das olimpíadas.

Infelizmente o nosso atleta foi “obstruído” já nos últimos km do percurso.

Bem, esses são os fatos!

Mas, o que deve chamar mais a atenção agora  depois do ocorrido não deve ser o gesto infeliz do “fanático religioso”.

E sim, a declaração do nosso atleta:

“Não guardo mágoas do que ele fez… eu o perdôo…

estou muito feliz com a medalha de bronze e quero dividir esta alegria com os brasileiros” 

 Nosso atleta demonstrou 3 atitudes em Atenas:

1º Liderança absoluta da prova. Parecia o deus Hermes com suas asas nos pés!

2º  Espírito olímpico em voltar para a prova após a lamentável ocorrência.

3º O mais importante – espírito nobre de perdoar o ofensor.

 O perdão foi o maior feito que este grande atleta demonstrou ao mundo!

Se reunissemos todas as medalhas (ouro, prata, bronze) ganhas por todos os atletas olímpicos não valeria este gesto profundamente nobre e que deve ser seguido por todos. A capacidade de perdoar alguém que lhe prejudicou.

Certamente o COB com razão irá cobrar as responsabilidades junto ao comitê internacional pelo fato.

Mas a atitude de Vanderlei Cordeiro de Lima ficará registrada como o maior gesto Olímpico-Cristão da história das Olimpíadas! 

Valeu Vanderlei! Seu bronze vale ouro!   Seu gesto não tem preço!  Valeu brasileiro, por mostrar ao mundo um gesto de paz! 

“Anjo” de Vanderlei Cordeiro de Lima

 pede apenas um aperto de mão

Guilherme Roseguini – Folha de S.Paulo14/09/2004 – 09h17

Esparramado no sofá de sua casa, Polyvios Kossivas gostou do estilo daquele desconhecido corredor brasileiro que liderava a maratona nos Jogos de Atenas. Decidiu então desligar a TV e acompanhar a prova in loco. Chamou mulher e filha, deixou sua casa de número 26 na rua Papaflessa e seguiu para uma avenida na qual os atletas iriam passar.

Nem imaginava que, naquela abafada tarde do dia 29 de agosto, se      tornaria uma figura central para a definição do resultado


Polyvios Kossivas (à dir.)ajuda o brasileiro R.Sprich/Reuters
Quando vi o Vanderlei [Cordeiro de Lima] chegando perto de onde a gente estava, notei que a multidão começou a olhar para o outro lado da rua. Era o irlandês que aparecera como um raio para derrubar o atleta no chão”, recorda Kossivas, na entrevista que concedeu à Folha de S.Paulo. Foi naquele exato momento que ele se distinguiu dos outros espectadores. Vestido com camiseta azul, bermuda e mocassim, pulou a faixa que separava a torcida da pista, alcançou e empurrou o ex-padre Cornelius Horan e impediu que o brasileiro perdesse ainda mais tempo com o imprevisto.

Tudo sem pestanejar. “Reagi imediatamente, sem calcular os riscos. Eu afastei o intruso e vi o Vanderlei caído como um pássaro ferido. Comecei a gritar ´vai, vai’ para incentivá-lo“, relata.
As câmeras de TV registraram a cena. Depois, seguiram na captura de Vanderlei. O atleta retornou à corrida abatido, acabou ultrapassado por dois adversários e completou os 42.195 metros do percurso na terceira posição.

Kossivas, contudo, permaneceu no local do ataque. E viu o ex-padre ser castigado pelo público.

A multidão batia nele e gritava ‘o que você fez?’. Só depois foi algemado e tirado de lá pela polícia.”

Passado o susto, o circunspecto senhor voltou com a mulher Julia e a filha Smaragda para sua residência. Ligou novamente a televisão para assistir à chegada. Ficou emocionado. À noite, durante a cerimônia de premiação, chorou ao ver Vanderlei no terceiro degrau do pódio.

“Para mim, ele é o vencedor da maratona.”

No dia seguinte, colocou uma idéia fixa na cabeça: iria cumprimentar o maratonista. Queria uma aperto de mão, nada mais.

Seu primeiro reflexo foi ligar para a Embaixada do Brasil na Grécia. “Eles me disseram que toda a delegação já havia deixado o país e que os cumprimentos seriam transferidos para os dirigentes do esporte no Brasil”, explica.

Mal sabia ele que Vanderlei ainda estava em Atenas. Mais: segundo seu treinador, Ricardo D’Angelo, foi justamente no dia subseqüente à prova que o atleta assistiu ao vídeo da corrida e ficou impressionado com a atitude do senhor de barba e cabelos brancos.

“Comentamos ao ver a fita que o cara teve uma presença de espírito muito grande. Nós queríamos encontrá-lo para dizer obrigado. Por tudo o que ele fez por nós, começamos a chamá-lo pelo apelido de Zeus”, recorda o técnico.

Depois de retornar de Atenas e cumprir compromissos no Rio, em São Paulo e em Brasília, Vanderlei rumou para Maringá, no Paraná, onde vive com a família.

Mas seu caso segue indefinido. Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, pretendia dar início entre ontem e hoje na Corte Arbitral do Esporte (Suíça) aos procedimentos para tentar dar o ouro para o atleta.

Por hora, o maratonista pede isolamento. Quer pescar em paz. E segue sem conhecer a história

do anônimo que deu novo rumo ao dia mais maluco de sua vida.

Polyvios Kossivas nasceu em Atenas, tem 53 anos e é ligado ao esporte desde a infância. Entre 1964 e 1975, foi jogador de basquete na equipe do Sporting.

Detalhe: é a mesma agremiação que Gerasime Bozikis, hoje presidente da Confederação Brasileira de Basquete, defendeu na juventude –ele também nasceu na Grécia e depois veio ao Brasil. “Lembro-me do nome Bozikis, mas nunca atuamos juntos, porque ele é mais velho. Só muitos anos depois descobri que se tornou dirigente em outro país.”

Em 1976, Kossivas trocou de uniforme nas quadras e passou a atuar como árbitro, função que exerceu por dez anos. Hoje, longe do basquete, trabalha como vendedor. Seu maior desejo?

“Ainda quero muito encontrar o Vanderlei pessoalmente. Queria apertar sua mão e dizer que, depois de tê-lo ajudado, uma parte de mim também correu com ele.”

6– Textos e reflexões

 Parábolas e encantamentos

para uma cultura de paz

Os seres humanos, mesmo que disto não tenham consciência,

constroem o mundo imediato em que vivem e são por ele construídos.

Une morale nue apporte de l’énnui:

Le conte fait passer le précepte avec lui.

                                                             La Fontaine

Uma simples moral comunica desgosto:

Já o conto comporta preceitos.

                                                             La Fontaine, in Apólogo – Coelho Netto

As palavras não são só um instrumento de leitura da língua: são consideradas instrumentos de releitura coletiva da realidade social em que as pessoas estão ambientadas.

Reconhece-se assim o papel de extrema relevância que as palavras trazem em potencial e, ao mesmo tempo, seu viés pragmático, ou seja, o conjunto de relações sócio-culturais que a palavra gera na pessoa ou grupo que a utiliza.

Assim optamos pelos ensinamentos/aprendizados por metáforas contidas, inicialmente, em gêneros literários de mais fácil penetração e assimilação como parábolas, fábulas e apólogos, bem como em poemas, excertos de obras literárias de maior envergadura, reflexões. E ao optarmos pela comunicação por metáforas, reconhecemos a metáfora em seu valor dual (heurístico e estético), com função múltipla (pedagógica, estética, cogniscitiva), como um recurso em que se condensa a atividade da imaginação que toma contacto com a realidade mediante a criação e a fantasia e não só através da fria razão analítica. Afora o prazer estético que desperta/comunica, a metáfora ativa a procura inconsciente de novos significados e recursos, revelando elementos ocultos que apenas o inconsciente pode perceber e utilizar. É a forma que optamos para transitar entre o domínio

 do conceitual e do factual, na busca de uma comunicação sem fronteiras.

Quase sempre estes textos constituem-se, em seu todo, em grandes metáforas. Seguramente, por isso mesmo, à parte, o detalhe – a metáfora – é tomado para designar o todo – o gênero literário.

Assim, freqüentemente, a história contada é apresentada genericamente como metáfora, e não por suas designações de gênero – fábula, parábola, apólogo, entre outros – trata-se de narrativas curtas, com grande poder de “encantamento” e afetação, relatos breves, com propósitos pedagógicos e utilização do método comparativo, possibilitados pela utilização de metáforas, empregadas sempre como recurso cognitivo e de forma.

 As metáforas são “ferramentas” importantes para educação e para a “apropriação” da realidade como um todo pelos seres humanos, e nem sempre nos temos dado conta desta importância.

Os eventos e relações de caráter mental e do âmbito social são especialmente complexos e frequentemente de difícil acessibilidade a uma observação ou abordagens diretas. Daí a importância das metáforas para abordarem/ descreverem fenômenos destes domínios apoiando-se em conceitos perceptivos, do domínio do conhecido e articulado, como nos informa Ortega, ao dizer que

”(…) la metáfora es un procedimiento intelectual por cuyo medio conseguimos aprehender lo que se halla más lejos de nuestra potencia conceptual. Con lo más próximo y lo que mejor dominamos podemos alcanzar contacto mental con lo remoto y más arisco. Es la metáfora un suplemento a nuestro brazo intelectivo”. (Ortega Y Gasset, Las dos grandes metáforas)

Aponta-nos Cristián Vásquez Rivera, da Universidad de Magallanes, Punta Arenas, no Chile, que nosso mundo está estruturado conceitualmente e que nosso sistema conceitual normal é metafórico em sua natureza:

 “Como hemos visto, las metáforas son una parte habitual de nuestra estructura concepctual. Surgidas de nuestra experiencia sensorio-motriz y articuladas en la semántica del lenguaje, y por tanto en la cultura, las metáforas nos ayudan no solamente a describir el mundo, sino que nos permiten definirlo, estipulando el marco de acción congruente con tal definición.” (Rivera- El uso de las metáforas en el aprendizaje)

Impregnam nossa comunicação mais corriqueira, ajudando-nos a dar conta de expressar e compreender nosso dia a dia. É exatamente o que fazemos quando falamos de “altas” “ou quedas de preços”, de ter “idéias brilhantes”, de “baixas paixões“, de um “sólido prestígio”, e estamos tão acostumados ao fato que estas afirmações nos parecem “descritivas”. Todavia ao analisarmos os exemplos citados constatamos tratar-se de expressões metafóricas, e que estão se referindo a um tipo de experiência fazendo alusão a uma outra.

O que equivale dizer que, com o apoio do  que é palpável,  tangível,  mais fácilmente acessamos o que é imensurável, intangível. Os valores morais e éticos.

E ainda mais como realça ainda o autor seu poder comunicacional, ou seja, de relação com o outro, e do ser humano consigo mesmo: 

 (…) “No sólo la necesitamos para hacer, mediante un nombre, comprensible a los demás nuestro pensamiento, sino que la necesitamos inevitablemente para pensar nosotros mismos ciertos objetos difíciles. Además de ser un medio de expresión, es la metáfora un medio esencial de intelección”. E adiante segue dizendo que “(…)nos sirve para hacer prácticamente asequible lo que se vislumbra en el confín de nuestra capacidad”.

Toma o autor, a quem o tema tanto interessou, como exemplo a metáfora “fundo da alma” para

chamar atenção para a duplicidade de sentidos contida no termo (…”al decir del alma que tiene ‘fondo’ nos referimos primariamente al fondo de un tonel, o cosa parecida”(…)), duplicidade que  faz parte da essência da metáfora e que implica certa desvirtuação de seu sentido original. Insta que para que haja metáfora é preciso que nos demos conta desta duplicidade, da mesma forma que deve ficar claro que se está fazendo uso de um nome “impropriamente”, mas cosciente de que o mesmo (o uso) é impróprio. Pergunta, então por que o usamos assim mesmo, sendo impróprio, não preferindo uma denominação direta e própria, e conclui:

“Si ese llamado ‘fondo del alma’ fuese cosa tan clara ante nuestra mente como el color rojo, no hay duda que poseeríamos un nombre directo y exclusivo para designarlo. Pero es el caso que no sólo nos cuesta trabajo nombrarlo, sino también pensarlo. Es una realidad escurridiza que se escapa a nuestra tenaza intelectual. Aquí empezamos a advertir el segundo uso, el más profundo y esencial de la metáfora en el conocimiento: No sólo la necesitamos para hacer, mediante un nombre, comprensible a los demás nuestro pensamiento, sino que la necesitamos inevitablemente para pensar nosotros mismos ciertos objetos difíciles. Además de ser un medio de expresión, es la metáfora un medio esencial de intelección.” (Ortega Y Gasset, opus cit.)

A tendência do pensamento atual, expressa por Ortega Y Gasset, entre outros, para quem a metáfora é um instrumento mental imprescindível, uma forma de pensamento, “un procedimiento intelectual por cuyo medio conseguimos aprehender lo que se halla más lejos de nuestra potencia conceptual”.

Coerentes com a abordagem apoiada na complexidade, assumimos em nosso trabalho o reconhecimento da importância da metáfora em seu valor dual (heurístico e estético), com função múltipla (pedagógica, estética, cogniscitiva). Como um recurso em que se condensa a atividade da imaginação que toma contacto com a realidade mediante a criação e a fantasia  e não só através da fria razão analítica; e poucos conseguiram expressar esta complexidade com clareza e sensibilidade como Ortega Y Gasset :

“No se entienda por esto que merced a ella transponemos los límites de lo pensable. Simplemente nos sirve para hacer prácticamente asequible lo que se vislumbra en el confín de nuestra capacidad. Sin ella, habría en nuestro horizonte mental una zona brava que en principio estaría sometida – a nuestra jurisdicción, pero de hecho quedaría desconocida e indómita. Como la metáfora ejerce en la ciencia un oficio suplente, sólo se la ha atendido desde el punto de vista de la poesía, donde su oficio es constituyente. Pero en estética la metáfora interesa por su fulguración deliciosa de belleza. De aquí que no se haya hecho constar debidamente que la metáfora es una verdad, es un conocimiento de realidades.” (Ortega Y Gasset, Las dos grandes metáforas.)

Como já exposto acima, os textos assim baseados em metáforas são meios, “caminhos”, “ferramentas” que, de uma maneira bem simples e eficaz, facilitam a apreensão, decodificação e recomposição da realidade. “Caminhos” literários e recursos comunicacionais, que com uma profundidade inesgotável, permitem ainda, por outro lado, muitas compreensões paralelas, estimulando a imaginação. Visam apresentar conceitos abstratos, valores, portanto nem sempre de fácil apreensão, tornando-os compreensíveis à maioria das pessoas.

Possuem em comum explícitas finalidades moralizadoras ou espiritualizantes, ensinamentos éticos, eficazes do ponto de vista “didático”, facilitando grandemente o acesso ao conteúdo a ser revelado ou explicado. Sem este recurso, falando apenas teoricamente sobre bondade, amizade, amor,

solidariedade, as pessoas demorariam em entender estes conceitos na sua devida profundidade.

Exemplificando, voar, o vôo, vistos em sentido metafórico (Como em Fernão Capelo Gaivota) ajudam a entender o conceito de transcendência, e mais ainda a complementaridade necessária entre imanência e transcendência. Pode sugerir tanto uma viagem para fora, através das janelas que abrimos para o mundo, sair de si, como também uma viagem para dentro, uma grande imersão em nós mesmos. A superação de nossos limites alçando vôos além, e ao mesmo tempo um grande mergulho em nosso interior. Voar para dentro. Voar por dentro, buscando identificar nossas situações interiores, nossas necessidades e os desejos de nossos próprios corpos.

Afora o prazer estético que desperta/comunica, a metáfora ativa a procura inconsciente de novos significados e recursos, revelando elementos ocultos que apenas o inconsciente pode perceber e utilizar.

Esses recursos literário/pedagógicos (parábolas, fábulas, apólogos,…) sempre com aspectos retórico-pragmáticos, mas com abordagens sensíveis, como já visto, estão presentes em todas as culturas, até mesmo nas mais longevas tradições religiosas.

Por mais de 30 anos, no programa de ação cultural, em trabalho com grupos de adolescentes e jovens, com a utilização destes gêneros literários, como ferramentas, associados a outros recursos (a sensibilização pela música, por exemplo), com resultados alentadores. Os participantes foram se tornando mais sensíveis, relacionando-se melhor uns com outros, com seus mais próximos, com o mundo. Muitos começaram a escrever e a se expressar melhor, e nisto vimos notando metamorfoses.

Os mesmos recursos foram utilizados  em trabalhos com professores das redes pública e particular de ensino, com resultados surpreendentes.

Afora o trabalho direto com os educadores visando o seu próprio crescimento, tenho estimulado a introdução destes textos diretamente em sala de aula, no trabalho com os educandos. Isto tem ampliado as possibilidades de comunicação e, consequentemente, as possibilidades didático /pedagógicas, através de seu enriquecimento por abordagens apoiadas no pensamento complexo. Isto tem contribuído grandemente para a oxigenação do pensamento no âmbito da Educção. Ampliação da visão de mundo, uma melhor compreensão de nossa realidade e melhoria na relação com a mesma.

A importância desse recurso literário se confirma, e diríamos até que se amplia, nos tempos presentes como instrumento bastante usado por profissionais de todas as áreas, advogados, comunicólogos, publicitários .

Afora a utilização de textos, outros meios como vídeos, filmes, apresentações em aplicativos e programas de informática, também têm se mostrado eficientes à difusão.

Em seguida passaremos a analisar as características estilístico/ estruturais de cada um dos gêneros em foco.

Parábola

E com muitas parábolas tais lhes dirigia a palavra

 segundo o que podiam compreender.” (S.Marcos 4:33)

A origem do termo deve ser buscada no grego, no termo parabolë, que significa comparação, alegoria ou semelhança, designando uma simples ilustração ou nota explicativa; parábola é uma composição literária em forma de pequena narrativa fictícia, de intenção moral e espiritual. Comunicauma lição ética por vias indiretas ou simbólicas, uma explicação séria, sem chegar à severidade, através de uma prosa altamente metafórica e por vezes hermética, em que se veiculam conceitos abstratos ou saberes apenas “acessíveis aos iniciados”. Incluem a comparação de um objeto real com que se pretende transmitir, mediante semelhanças apropriadas à clara compreensão. Suas finalidades, sua força pedagógica podem ser aquilatadas no seu uso exaustivo por lideranças religiosas, mormente Jesus, comprovado nos evangelhos, e em outras tradições religiosas. No caso do Novo Testamento, as parábolas constituíram-se em poderoso instrumento de ensino, utilizando-se de coisas comuns, ações rotineiras (semear, colher, cuidar da lavoura, dos rebanhos,…), Jesus revela como é Deus em seu amor e justiça, como é o seu reino, como entrar nele, explica o plano de salvação e as coisas complexas do amor e da verdade. A própria idéia de “reino” designado uma situação de vida diferente daquela que os que o ouviam levavam.

Conquanto os exemplos mais conhecidos sejam quase que exclusivamente os da Bíblia, onde se encontram em abundância (O filho Pródigo, Do semeador, da Ovelha perdida,…), o gênero é altamente cultivado no âmbito da “grande literatura”. Basta lembrar que em meados do século XIX, os aspectos paradoxais do ensino por parábolas foram recriados pelo filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, em seus tratados sobre a doutrina cristã; sua obra influenciou, já no século XX, o melhor da narrativa de Kafka (O Processo, 1925, ou O Castelo, 1926) e de Albert Camus (A Peste).

Lembro ainda que O Pequeno Príncipe, de Saint Exupéry, é uma grande metáfora, consistindo sua estrutura narrativa em uma seqüência de várias parábolas algumas hibridadas com fábulas (A Raposa, por exemplo, a Serpente,…). E nesse contexto é importante lembrar, mais uma vez, o teólogo Leonardo Boff que tão bem trabalha o paralelo transcendência – imanência através da parábola da águia e da galinha.

Semelhantes à fábula e ao apólogo, diferenciam-se as parábolas daqueles por serem protagonizadas por seres humanos.

Apólogo

 Ao contrário da parábola, em sua narrativa o apólogo apresenta-se, quase sempre, mais conciso com um tom alegre e jovial, sempre protagonizado por objetos inanimados (plantas, pedras, rios, relógios, moedas, etc).

O termo apólogo também vem do grego, apólogos, em que designa pura e simplesmente narração, acreditando-se que suas origens, remotas e obscuras, sejam provavelmente orientais; gênero também comum a todos os povos, encontrou cultores entre os grandes literatos, destacando-se Machado de Assis (“Um Apólogo”, ainda conhecido por “A Agulha e a Linha”), Coelho Neto (“Apólogos” 1904). Acredito, entretanto, que, talvez, o apólogo mais conhecido seja  o Soldadinho de Chumbo. (12)

Fábula

O termo fábula vem do latim fabula, ae designandonarração. Ao contrário dos outros dois gêneros que se apresentam sempre em prosa, a fábula freqüentemente aparece em forma de poesia e sempre protagonizada por animais irracionais, cujos comportamentos, preservando as características próprias, deixam transparecer uma alusão, via de regra satírica ou pedagógica, aos seres humanos. Gênero comum a todas as literaturas, deve sempre apresentar esses dois elementos: Sentença moral (sua finalidade) e ficção (meio). Freqüentemente as fábulas são produzidas em forma de poesia.

Graças a La Fontaine a fábula ganhou resplendor a partir no século XVIII. Quem não conhece, em nossos dias, a sua A cigarra e a formiga?

Histórias

Exposição romanceada de fatos e episódios, os mais diversos. São narrativas ficcionais, que sempre dão conta de casos exemplares. Aqui podem ser incluídos os contos populares ou narrativas tradicionais.

Ilações

De minha parte denomino ilações um gênero de relatos, sem bases metafóricas, mas simbólicas, mostrando exemplos da natureza, de forma especial entre os animais, e elucidam valores fundamentais como solidariedade, compartilhamento. Indicam as lições, deduções que possam ser tiradas, àquilo que se conclui de certos fatos; é o caso do “Voando com os gansos” (13).

Atualmente os recursos computacionais nos permitem ampliar grandemente o poder de propagação destes textos e “mensagens”, como no caso das apresentações criadas em aplicativos de informática que, quando possíveis, possuem um tão grande poder de afetação, pela junção, além das metáforas dos recursos de imagem, som, cores, movimentos.

Uma história de Gandhi

Contribuindo para as reflexões sobre esta nova percepção da paz  em cada um deve se sentir “agente de transformação com o poder de contribuir na afirmação coletiva de respeito, legitimação e solidariedade mútua”, a Profa. Lia Diskin, com sua generosidade habitual, compartilhou conosco uma história que Arun Gandhi contou para um grupo de pessoas, em Brasília, que, por sua vez, quando ouviu de seu avô, o Mahatma, e que nos ajuda a compreender o que buscamos com a Bandeira da Paz:

Um rei da Índia antiga ficou curioso a respeito do significado da Paz. Convidou todos osmestres e filósofos das suas terras e pediu esclarecimentos. Cada um desfilou suas teorias, mas o rei ficou insatisfeito, sem compreender de fato em que consistia a Paz.

Nesse período estava de visita à cidade um professor estrangeiro que, havendo tomado conhecimento das inquietações do rei, apresentou-se a ele e disse:

  • “Fora do vosso reino vive um velho sábio. Ele é tão velho que dificilmente conseguiria chegar até Vossa Majestade. Talvez ele possa responder a vossos anseios”.

O rei partiu ao encontro do sábio, e quando chegou à sua casa foi conduzido em silêncio até a cozinha. Lá o velho homem pegou um grão de trigo, que colocou na mão do rei, dizendo:

  • ‘‘A resposta é esta”.

O monarca, orgulhoso demais para pedir explicações, levou o grão a seu palácio e o guardou numa caixinha de ouro. Todos os dias abria a caixa em busca de algum tipo de resposta. Mas nada +-acontecia, por mais atentamente que observasse.

  • “Todos os dias examino o grão de trigo, porém não acho resposta alguma. Por favor, me explique o que está acontecendo”.
  • “Vossa Majestade, se guardar essa grão numa caixa nada acontecerá…talvez apodreça. Entretanto, se permitir que o grão se relacione com outros elementos – ar, água, terra – ele poderá germinar, produzir campos de trigo e alimentar a muitas pessoas”.

Se guardamos a Paz (o grão) para nós mesmos (a caixa), não obteremos benefícios. Mas se multiplicarmos seu potencial, partilhando-os com outros, ele pode germinar e alimentar multidões.

A Ratoeira

Um rato olhando pelo buraco na parede vê o fazendeiro e sua esposa abrindo um pacote. Pensou logo em que tipo de comida poderia ter ali. Ficou aterrorizado quando descobriu que era uma ratoeira. Foi para o pátio da fazenda advertindo a todos:

– “Tem uma ratoeira na casa, uma ratoeira na casa!”

A galinha, que ali estava cacarejando e ciscando, levatou a cabeça e disse:

– “Desculpe-me Sr. Rato, eu entendo que é um grande problema para o senhor, mas não ma prejudica em nada, não me incomoda!”.

O rato foi até o porco e disse a ele:

-“Tem uma ratoeira na casa, uma ratoeira!”

– “Desculpe-me Sr. Rato, mas não há nada que eu possa fazer, a não ser rezar. Fique tranquilo que o senhor será lembrado nas minhas preces.”

 O rato se dirigiu-se então à vaca. Ela disse:

-“O que senhor Rato? Uma ratoeira? Por acaso estou em perigo? Acho que não!”

Então o rato voltou para a casa, cabisbaixo e abatido, para encarar a ratoeira do fazendeiro. Naquela noite ouviu-se um barulho, como o de uma ratoeira pegando sua vítima. A mulher do fazendeiro correu para ver o que havia pego. No escuro, ela não viu que a ratoeira pegou a cauda de uma cobra venenosa. A cobra picou a mulher.

O fazendeiro a levou imediatamente ao hospital. Ela voltou com febre. Todo mundo sabe que para alimentar alguém com febre, nada melhor que uma canja. O fazendeiro pegou seu cutelo e foi providenciar o ingrediente principal. Como a doença da mulher continuava, os amigos e vizinhos vieram visitá-la. Para alimentá-los o fazendeiro matou o porco. A mulher não melhorou e acabou morrendo. Muita gente veio ao funeral. Então o fazendeiro sacrificou a vaca para alimentar todo aquele povo.

Quando você ouvir dizer que alguém esta diante de um problema e acreditar que o problema não lhe diz respeito, lembre-se que, quando há uma ratoeira na casa, toda a fazenda corre risco.

A Carpintaria

Contam que em uma carpintaria houve certa vez, uma estranha assembléia. Foi uma reunião de ferramentas para acertar suas diferenças.

O martelo exerceu a presidência, mas os participantes lhe notificaram que teria que renunciar porque fazia demasiado barulho e, além do mais, passava todo o tempo golpeando.

O martelo aceitou a culpa, mas pediu que também fosse expulso o parafuso que, segundo ele, dava muitas voltas para conseguir algo. Diante do ataque, o parafuso concordou, mas, por sua vez, pediu a expulsão da lixa. Dizia que ela era muito áspera no tratamento com os demais, entrando sempre em atritos…

A lixa acatou, com a condição que se expulsassem o metro que sempre media os outros segundo a sua medida, como se fora o único perfeito.

Nesse momento, entrou o carpinteiro, juntou o material e começou o trabalho.

Utilizou o martelo, o parafuso, a lixa, o metro e o serrote. Finalmente, a madeira rústica se converteu num fino móvel.

Quando a carpintaria ficou novamente só, a assembléia reativou a discussão. O serrote tomou a palavra.

 “Senhores, ficou demostrado que temos defeitos, mas o carpinteiro trabalha com as nossas qualidades, com nossos pontos valiosos. Assim, não pensemos em nossos pontos fracos e concentremo-nos em nossos pontos fortes.”

Todos entenderam então que, o martelo era forte, o parafuso unia, a lixa era especial para limar e afinar as asperezas e o metro era preciso e exato. Sentiram-se, então, como uma equipe capaz de produzir móveis de qualidade, e passaram a trabalhar em grupo com alegria.                                                         (Autor desconhecido)

Um Apólogo

Machado de Assis

Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:

— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo?

— Deixe-me, senhora.

— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável?

Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.

— Que cabeça, senhora?  A senhora não é alfinete, é agulha.  Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.

— Mas você é orgulhosa.

— Decerto que sou.

— Mas por quê?

— É boa!  Porque coso.  Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?

— Você?  Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu e muito eu?

— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados…

— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás obedecendo ao que eu faço e mando…

— Também os batedores vão adiante do imperador.

— Você é imperador?

— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto…

Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.  Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha:

Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco?  Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima…

A linha não respondia; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura, para o dia seguinte. Continuou ainda nesse e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.

Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava de um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha para mofar da agulha, perguntou-lhe:

— Ora, agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas?  Vamos, diga lá.

Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha: 

— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico. 

Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:

— Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!

 Para Gostar de Ler – Volume 9 – Contos“, Editora Ática – São Paulo, 1984, pág. 59.

             

Caminho

Hayeg

Antes de eu entrar nesta vida, um dia, eu vi um anjo que me mostrou o que aconteceria:

Deixou-me ver todas as minhas feridas e todas as minhas falhas cometidas. Deixou-me saber de todos os meus pecados e de todos os padecimentos a mim reservados. O deserto, sem amor, e cheio de paixões odiosas e muitas horas, escuras e dolorosas.

Também me mostrou os ébrios delírios meus, que sentiria como se fosse um deus.

Vivendo no Éter, do fardo me livraria e das escuridões na luz adejaria.

Delícias incomensuráveis do amor me prometeu, das quais um dia meu coração seria cheio, e todo o meu ser estremeceu, e fui envolvido por mil sóis do céu!

Tendo-me assim mostrado o caminho, com seus infernos e seus paraísos, falou-me o Anjo, gravemente:

– Queres trilhá-lo?

E eu, devagar, após longo silêncio, disse:

– Sim, eu quero o caminho. Ele é minha vontade! Todo seu prazer e sua tormenta toda, escolho-os em liberdade!

Foi assim que entrei neste mundo. Um ser envolvido por ilusão e realidade, consagrado ao claro dia e à noite escura, que, em breve, à eternidade será recolhido.

Apólogo de Jotão

Depois, o jovem Jotão, de um alto monte, proferiu um apólogo, ou seja, uma historieta que ilustra uma lição de sabedoria e cuja moralidade é expressa como conclusão. Ei-lo:

Foram certa vez as árvores a ungir para si um rei, e disseram à oliveira:

– Reina sobre nós.

Porém a oliveira lhes respondeu:

– Deixaria eu o meu óleo, que Deus e os homens em mim prezam, e iria pairar sobre as árvores?

Então disseram as árvores à figueira:

– Vem tu, e reina sobre nós.

Porém a figueira lhes respondeu:

– Deixaria eu a minha doçura, o meu bom fruto, e iria pairar sobre as árvores?

Então disseram as árvores à videira:

– Vem tu, e reina sobre nós.

Porém a videira lhes respondeu:

– Deixaria eu o meu vinho, que agrada a Deus e aos homens, e iria pairar sobre as árvores.

Então todas as árvores disseram ao espinheiro:

– Vem tu, e reina sobre nós.

Respondeu o espinheiro às árvores:

– Se realmente me ungis rei sobre vós, vinde, e refugiai debaixo da minha sombra” (Juízes 9.7-21).

As cores 

norueguês Jill Slee Blockodder

Disse o Vermelho ao Azul:

“Amigo, como é possível que

o seu rezar não seja

feliz como o meu”?

O Azul disse, em resposta:

“Vermelho, por que

a sua prece não tem

o sentimento da minha”?

O Amarelo disse ao Verde:

“Meu amigo, por que ao rezar

nunca se ajoelha ou se curva”?

Disse o Verde ao Amarelo:

“Você chama a isso rezar?

Discordo, não é assim que se faz”.

Então vieram o Índigo e o Laranja

Com outras formas de prece,

velhas e novas.

O Violeta, coitado, ficou pálido

como se estivesse com medo.

Para todos, ele rezava em segredo.

“Ó cores, disse então Deus:

Cada uma de vocês é minha.

Sem minha luz, como

poderiam brilhar”?

“Rezem como sua cor lhes mandar.

Não deixem de brilhar.

Preciso de suas diferenças:

Elas fazem o meu arco-íris.”

7– Documentos

Declaração sobre uma Cultura de Paz

Retirado do Comitê Paulista para a Década da Cultura de Paz

 parceria Unesco- Associação Palas Athena

A Assembleia Geral,

Considerando a Carta das Nações Unidas, incluindo os objetivos e princípios nela enunciados,

Considerando também que na Constituição da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura se declara que “posto que as guerras nascem na mente dos homens, é na mente dos homens onde devem erigir-se os baluartes da paz”,

Considerando ainda a Declaração Universal dos Direitos Humanos e outros instrumentos internacionais pertinentes ao sistema das Nações Unidas,

Reconhecendo que a paz não é apenas a ausência de conflitos, mas que também requer um processo positivo, dinâmico e participativo em que se promova o diálogo e se solucionem os conflitos dentro de um espírito de entendimento e cooperação mútuos,

Reconhecendo também que com o final da guerra fria se ampliaram as possibilidades de implementar uma Cultura de Paz,

Expressando profunda preocupação pela persistência e a proliferação da violência e dos conflitos em diversas partes do mundo,

Reconhecendo a necessidade de eliminar todas as formas de discriminação e intolerância, inclusive aquelas baseadas em raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, na origem nacional, etnia ou condição social, na propriedade, nas discapacidades, no nascimento ou outra condição,

Considerando sua resolução 52/15, de 20 de novembro de 1997, em que proclamou o ano 2000 “Ano Internacional da Cultura de Paz”, e sua resolução 53/25, de 10 de novembro de 1998, em que proclamou o período 2001-2010 “Década Internacional para uma Cultura de Paz e não-violência para as crianças do mundo”,

Reconhecendo a importante função que segue desempenhando a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura na promoção de uma Cultura de Paz,

Proclama solenemente a presente Declaração sobre uma Cultura de Paz, com o objetivo que os Governos, as organizações internacionais e a sociedade civil possam orientar suas atividades por suas sugestões, a fim de promover e fortalecer uma Cultura de Paz no novo milênio:

Artigo 1º

Uma Cultura de Paz é um conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos e estilos de vida baseados:

a) No respeito à vida, no fim da violência e na promoção e prática da não-violência por meio da educação, do diálogo e da cooperação;

b) No pleno respeito aos princípios de soberania, integridade territorial e independência política dos Estados e de não ingerência nos assuntos que são, essencialmente, de jurisdição interna dos Estados, em conformidade com a Carta das Nações Unidas e o direito internacional; Comitê Paulista para a Década da Cultura de Paz – parceria UNESCO-Associação Palas Athena;

c) No pleno respeito e na promoção de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais;

d) No compromisso com a solução pacífica dos conflitos;

e) Nos esforços para satisfazer as necessidades de desenvolvimento e proteção do meio-ambiente para as gerações presente e futuras;

f) No respeito e promoção do direito ao desenvolvimento;

g) No respeito e fomento à igualdade de direitos e oportunidades de mulheres e homens;

h) No respeito e fomento ao direito de todas as pessoas à liberdade de expressão, opinião e informação;

i) Na adesão aos princípios de liberdade, justiça, democracia, tolerância, solidariedade, cooperação, pluralismo, diversidade cultural, diálogo e entendimento em todos os níveis da sociedade e entre as nações;

j) Todos animados por uma atmosfera nacional e internacional que favoreça a paz.

Artigo 2º

O progresso até o pleno desenvolvimento de uma Cultura de Paz se conquista através de valores, atitudes, comportamentos e estilos de vida voltados ao fomento da paz entre as pessoas, os grupos e as nações.

Artigo 3º

O desenvolvimento pleno de uma Cultura de Paz está integralmente vinculado:

  1. À promoção da resolução pacífica dos conflitos, do respeito e entendimento mútuos e

da cooperação internacional;

b) Ao cumprimento das obrigações internacionais assumidas na Carta das Nações Unidas e ao direito internacional;

c) À promoção da democracia, do desenvolvimento dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e ao seu respectivo respeito e cumprimento;

d) À possibilidade de que todas as pessoas, em todos os níveis, desenvolvam aptidões para o diálogo, negociação, formação de consenso e solução pacífica de controvérsias;

e) Ao fortalecimento das instituições democráticas e à garantia de participação plena no processo de desenvolvimento;

f) À erradicação da pobreza e do analfabetismo, e à redução das desigualdades entre as nações e dentro delas;

g) À promoção do desenvolvimento econômico e social sustentável;

h) À eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, promovendo sua autonomia e uma representação equitativa em todos os níveis nas tomadas de decisões;

i) Ao respeito, promoção e proteção dos direitos da criança;

j) À garantia de livre circulação de informação em todos os níveis e promoção do acesso a ela;

k) Ao aumento da transparência na prestação de contas na gestão dos assuntos públicos;

l) À eliminação de todas as formas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlatas;

m) À promoção da compreensão, da tolerância e da solidariedade entre todas as civilizações, povos e culturas, inclusive relação às minorias étnicas, religiosas e linguísticas;

n) Ao pleno respeito ao direito de livre determinação de todos os povos, incluídos os que vivem sob dominação colonial ou outras formas de dominação ou ocupação estrangeira, como está consagrado na Carta das Nações Unidas e expresso nos Pactos internacionais de direitos humanos, bem como na Declaração sobre a concessão da independência aos países e povos colonizados contida na resolução 1514 (XV) da Assembleia Geral, de 14 de dezembro de 1960.

Artigo 4º

A educação, em todos os níveis, é um dos meios fundamentais para construir uma Cultura de Paz. Neste contexto, a educação sobre os direitos humanos é de particular relevância.

Artigo 5º

Os governos têm função primordial na promoção e no fortalecimento de uma Cultura de Paz.

Artigo 6º

A sociedade civil deve comprometer-se plenamente no desenvolvimento total de uma Cultura de Paz.

Artigo 7º

O papel informativo e educativo dos meios de comunicação contribui para a promoção de uma Cultura de Paz.

Artigo 8º

Desempenham papel-chave na promoção de uma Cultura de Paz os pais, os professores, os políticos, os jornalistas, os órgãos e grupos religiosos, os intelectuais, os que realizam atividades científicas, filosóficas, criativas e artísticas, os trabalhadores em saúde e de atividades humanitárias, os trabalhadores sociais, os que exercem funções diretivas nos diversos níveis, bem como as organizações não-governamentais.

Artigo 9º

As Nações Unidas deveriam seguir desempenhando uma função crítica na promoção e fortalecimento de uma Cultura de Paz em todo o mundo.

Programa de Ação sobre uma Cultura de Paz

A Assembleia Geral,

Tendo em conta a Declaração sobre uma Cultura de Paz aprovada em 13 de setembro

de 1999,

Considerando sua resolução 52/15, de 20 de novembro de 1997, na qual proclamou o ano 2000 “Ano Internacional da Cultura de Paz” e sua resolução 53/25, de 10 de novembro de 1998, na qual proclamou o período 2001-2010 “Década Internacional para uma Cultura de Paz e não-violência para as crianças do mundo”,

Aprova o seguintePrograma de Ação sobre uma Cultura de Paz:

Objetivos, estratégias e agentes principais:

1. O Programa de Ação constituiria a base do Ano Internacional da Cultura de Paz e da Década Internacional para a Cultura de Paz e não-violência para as crianças do mundo.

2. Estimular os Estados Membros para que adotem medidas para promover uma Cultura de Paz no plano nacional, bem como nos planos regional e internacional.

3. A sociedade civil deveria participar nos planos local, regional e nacional, com o objetivo de ampliar o alcance das atividades concernentes a uma Cultura de Paz.

4. O sistema das Nações Unidas deveria fortalecer as atividades que realiza em prol de uma Cultura de Paz.

5. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura deveria manter sua função essencial na promoção de uma Cultura de Paz e contribuir para sua construção de forma significativa.

6. Deveriam-se fomentar e consolidar as associações entre os diversos agentes destacados na Declaração para um movimento mundial para uma Cultura de Paz.

7. Uma Cultura de Paz se promove mediante o intercâmbio de informação entre os agentes sobre as iniciativas com este objetivo.

8. A execução eficaz do Programa de Ação exige a mobilização de recursos, inclusive financeiros, por parte dos governos, das organizações e indivíduos interessadas.

Consolidação de medidas que adotem todos os agentes pertinentes nos planos nacional, regional e internacional

9. Medidas para promover uma Cultura de Paz por meio da educação:

a) Revitalizar as atividades nacionais e a cooperação internacional destinadas a promover os objetivos da educação para todos, com vistas a alcançar o desenvolvimento humano, social e econômico, e promover uma Cultura de Paz;

b) Zelar para que as crianças, desde a primeira infância, recebam formação sobre valores, atitudes, comportamentos e estilos de vida que lhes permitam resolver conflitos por meios pacíficos e com espírito de respeito pela dignidade humana e de tolerância e não discriminação;

c) Preparar as crianças para participar de atividades que lhes indiquem os valores e os objetivos de uma Cultura de Paz;

d) Zelar para que haja igualdade de acesso às mulheres, especialmente as meninas, à educação;

e) Promover a revisão dos planos de estudo, inclusive dos livros didáticos, levando em conta a Declaração e o Plano de Ação Integrado sobre a Educação para a Paz, os Direitos Humanos e a Democracia de 1995, para o qual a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura prestaria cooperação técnica, se solicitada;

f) Promover e reforçar as atividades dos agentes destacados na Declaração, em particular a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, destinadas a desenvolver valores e aptidões que beneficiem uma Cultura de Paz, inclusive a educação e a capacitação na promoção do diálogo e do consenso;

g) Estimular as atividades em curso das entidades ligadas ao sistema das Nações Unidas a capacitar e educar, quando for o caso, nas esferas da prevenção dos conflitos e gestão de crises, resolução pacífica das controvérsias e na consolidação da paz após os conflitos;

h) Ampliar as iniciativas em prol de uma Cultura de Paz empreendidas por instituições de ensino superior de diversas partes do mundo, inclusive a Universidade das Nações Unidas, a Universidade para a Paz e o projeto relativo ao Programa de universidades gêmeas e de Cátedras da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

10. Medidas para promover odesenvolvimento econômico e social sustentável:

a) Tomar medidas amplas baseadas em estratégias adequadas e objetivos acordados, a fim de erradicar a pobreza, mediante atividades nacionais e internacionais, incluindo a cooperação internacional;

b) Fortalecer a capacidade nacional para aplicar políticas e programas destinados a reduzir as desigualdades econômicas e sociais dentro das nações, por meio, entre outras coisas, da cooperação internacional;

c) Promover soluções efetivas, eqüitativas, duradouras e orientadas ao desenvolvimento para os problemas da dívida externa e serviço da dívida dos países em desenvolvimento, por meio, entre outras coisas, da diminuição da carga da dívida;

d) Fortalecer as medidas adotadas, em todos os níveis, para aplicar estratégias nacionais em prol da segurança alimentar sustentável, inclusive com a elaboração de medidas para mobilizar e aproveitar ao máximo a destinação e utilização de recursos obtidos de todas as fontes, incluindo-se os obtidos com a cooperação internacional, como os recursos procedentes da diminuição da carga da dívida;

e) Adotar mais medidas que zelem para que o processo de desenvolvimento seja participativo, e

para que os projetos de desenvolvimento contem com a plena participação de todos;

f) Incluir uma perspectiva de gênero e o fomento da autonomia de mulheres e meninas como parte integrante do processo de desenvolvimento;

g) Incluir nas estratégias de desenvolvimento medidas especiais em que sejam atendidas as necessidades de mulheres e crianças, bem como de grupos com necessidades especiais;

h) Através da assistência ao desenvolvimento após os conflitos, fortalecer os processos de reabilitação, reintegração e reconciliação de todos os envolvidos no conflito;

i) Incluir medidas de criação de capacidade nas estratégias de desenvolvimento dedicadas à sustentabilidade do meio-ambiente, incluídas a conservação e regeneração da base de recursos naturais;

j) Eliminar obstáculos que impeçam a realização do direito à livre determinação dos povos, em particular dos povos subjugados pela dominação colonial ou outras formas de dominação ou ocupação estrangeira, que afetam negativamente seu desenvolvimento social e econômico.

11. Medidas para promover o respeito a todos os direitos humanos:

a) Aplicar integralmente a Declaração e Programa de Ação de Viena;

b) Estimular a formulação de planos de ação nacionais para promover e proteger todos os direitos humanos;

c) Fortalecer as instituições e capacidades nacionais na esfera dos direitos humanos, inclusive por meio das instituições nacionais de direitos humanos;

d) Realizar e aplicar o direito ao desenvolvimento estabelecido na Declaração sobre o direito ao desenvolvimento e a Declaração e Programa de Ação de Viena;

e) Alcançar os objetivos da Década das Nações Unidas para a educação na esfera dos direitos humanos, 1995-2004;

f) Difundir e promover a Declaração Universal dos Direitos Humanos em todos os níveis;

g) Dar apoio mais significativo às atividades que o Alto Comissionado das Nações Unidas para os Direitos Humanos realiza no desempenho de seu mandato, estabelecido na resolução 48/141 da Assembleia Geral, de 20 de dezembro de 1993, bem como as responsabilidades estabelecidas em resoluções e decisões subsequentes.

12. Medidas para garantir aigualdade entre mulheres e homens:

a) Integrar a perspectiva de gênero na aplicação de todos os instrumentos internacionais pertinentes;

b) Intensificar a aplicação dos instrumentos internacionais em que se promove a igualdade entre mulheres e homens;

c) Aplicar a Plataforma de Ação de Beijing, aprovada na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher, com os recursos e a vontade política que sejam necessários e através, entre outras coisas, da elaboração, aplicação e consecução dos planos de ação nacionais;

d) Promover a igualdade entre mulheres e homens na adoção de decisões econômicas, sociais e políticas;

e) Prosseguir no fortalecimento das atividades das entidades vinculadas ao sistema das Nações

Unidas destinadas a eliminar todas as formas de discriminação e violência contra a mulher;

f) Prestar apoio e assistência às mulheres que tenham sido vítimas de qualquer forma de violência, inclusive doméstica, no local de trabalho e durante conflitos armados.

13. Medidas para promover a participação democrática:

a) Consolidar todas as atividades destinadas a promover princípios e práticas democráticos;

b) Ter especial empenho nos princípios e práticas democráticos em todos os níveis de ensino escolar, extra curricular e não escolar;

c) Estabelecer e fortalecer instituições e processos nacionais em que se promova e se apoie a democracia por meio, entre outras coisas, da formação de funcionários públicos e a criação de capacitação nesse setor;

d) Fortalecer a participação democrática por meio, entre outras coisas, da prestação de assistência a processos eleitorais, a pedido dos Estados interessados e em conformidade com as diretrizes pertinentes às Nações Unidas;

e) Lutar contra o terrorismo, o crime organizado, a corrupção, bem como contra a produção, tráfico e consumo de drogas ilícitas e lavagem de dinheiro, por conta de sua capacidade de minar/solapar a democracia e impedir o pleno desenvolvimento de uma Cultura de Paz.

14. Medidas destinadas a promover a compreensão, a tolerância e a solidariedade:

a) Aplicar a Declaração de Princípios sobre a Tolerância e o Plano de Ação de Consecução do Ano das Nações Unidas para a Tolerância(1995);

b) Apoiar as atividades que se realizem no contexto do Ano das Nações Unidas para o Diálogo entre Civilizações, que se celebrará em 2001;

c) Aprofundar os estudos das práticas e tradições locais ou autóctones de solução de controvérsias e promoção da tolerância, com o objetivo de aprender a partir delas;

d) Apoiar as medidas em que se promovam a compreensão, a tolerância e a solidariedade em toda a sociedade, em particular com os grupos vulneráveis;

e) Continuar apoiando a obtenção dos objetivos da Década Internacional das Populações Indígenas do Mundo;

f) Apoiar as medidas em que se promovam a tolerância e a solidariedade com os refugiados e as populações deslocadas, levando em conta o objetivo de facilitar seu regresso voluntário e sua integração social;

g) Apoiar as medidas em que se promovam a tolerância e a solidariedade com os migrantes;

h) Promover uma maior compreensão, tolerância e cooperação entre todos os povos, por meio, entre outras coisas, da utilização adequada de novas tecnologias e difusão de informação;

i) Apoiar as medidas que promovem compreensão, tolerância, solidariedade e a cooperação entre os povos, entre as nações e dentro delas.

15. Medidas destinadas a apoiar a comunicação participativa e a livre circulação de informação e conhecimento:

a) Apoiar a importante função que os meios de comunicação desempenham na promoção de uma Cultura de Paz;

b) Zelar pela liberdade de imprensa, liberdade de informação e de comunicação;

c) Fazer uso eficaz dos meios de comunicação na promoção e difusão da informação sobre uma Cultura de Paz, contando com a participação, conforme o caso, das Nações Unidas e dos mecanismos regionais, nacionais e locais pertinentes;

d) Promover a comunicação social a fim de que as comunidades possam expressar suas necessidades e participar na tomada de decisões;

e) Adotar medidas acerca do problema da violência nos meios de informação, inclusive as novas tecnologias de comunicação, entre outras, a Internet;

f) Incrementar as medidas destinadas a promover o intercâmbio de informação sobre as novas tecnologias da informação, inclusive a Internet.

16. Medidas para promover a paz e a segurança internacionais:

a) Promover o desarmamento geral e completo sob estrito e efetivo controle internacional, levando em conta as prioridades estabelecidas pelas Nações Unidas na esfera do desarmamento;

b) Inspirar-se, quando procedentes, nas experiências favoráveis a uma Cultura de Paz obtidas de atividades de “conversão militar”, realizadas em alguns países do mundo;

c) Destacar como inadmissível a anexação de territórios mediante a guerra, e a necessidade de trabalhar em prol de uma paz justa e duradoura em todas as partes do mundo;

d) Estimular a adoção de medidas de fomento da confiança e atividades para a negociação de resoluções pacíficas de conflitos;

e) Tomar medidas para eliminar a produção e o tráfico ilícito de armas pequenas e leves;

f) Apoiar atividades, nos níveis nacional, regional e internacional, destinadas à solução de problemas concretos que surjam após os conflitos, como a desmobilização e a reintegração de ex-combatentes à sociedade, bem como de refugiados e populações deslocadas, a execução de programas de recolhimento de armas, o intercâmbio de informação e o fomento da confiança;

g) Desestimular e abster-se de adotar qualquer medida unilateral que não esteja em consonância com o direito internacional e a Carta das Nações Unidas, e dificulte a obtenção plena de desenvolvimento econômico e social da população dos países afetados, em particular mulheres e crianças, que impeçam seu bem-estar, criem obstáculos para o gozo pleno de seus direitos humanos, incluído o direito de todos a um nível de vida adequado para sua saúde e bem-estar e o direito a alimentos, a assistência médica e serviços sociais necessários, ao mesmo tempo em que se reafirma que os alimentos e medicamentos não devem ser utilizados como instrumento de pressão política;

h) Abster-se de adotar medidas de coação militar, política, econômica ou de qualquer outra natureza, que não estejam em consonância com o direito internacional e a Carta, e cujo objetivo seja atentar contra a independência política ou a integridade territorial dos Estados;

i) Recomendar que se dê atenção adequada à questão das repercussões humanitárias das sanções,

em particular para as mulheres e crianças, com vistas a reduzir ao mínimo as consequências

 humanitárias das sanções;

j) Promover uma maior participação da mulher na prevenção e solução de conflitos e, em particular, nas atividades em que se promova uma Cultura de Paz após os conflitos;

k) Promover iniciativas de solução de conflitos, como o estabelecimento de dias de cessar fogo para a realização de campanhas de vacinação e distribuição de medicamentos, corredores de paz que permitam a entrega de provisões humanitárias e santuários de paz para respeitar o papel fundamental das instituições sanitárias e médicas, como hospitais e clínicas;

l) Estimular a capacitação em técnicas de entendimento, prevenção e solução de conflitos, ministradas ao pessoal interessado das Nações Unidas, das organizações regionais vinculadas e dos Estados Membros, mediante solicitação, em conformidade.

                                                                                                                 107ª sessão plenária

                                                                                                            13 de setembro de 1999

Tradução do original em espanhol: Elisabete de Moraes Santana – Revisão técnica: Lia Diskin

8– Variedades

O Epicentro do Movimento

Parque da Água Branca – Uma ilha verde dentro da cidade

O Parque da Água Branca, local eleito para o Revelando São Paulo, tem se mostrado, por sua localização, sua configuração, infra-estrutura bem como pela disposição de sua coordenação, o espaço ideal para o evento.

Inaugurado em 1929 com área aproximada de 13 hectares, vários prédios em estilo normando projetados por Mário Whately e vitrais Art Déco de Antônio Gomide, o Parque da Água Branca por muito tempo constituiu-se em atração para a população em geral e opção de lazer segura para as famílias.

Situado em região nobre da cidade (Perdizes, Barra Funda, Pompéia), com população com renda alta e inúmeras escolas particulares conceituadas, além de universidades, por sua significação histórica e cultural, bem como pela importância do seu verde para a cidade, o Parque foi tombado pelo CONDEPHAAT em 1996. Passou por profunda reformulação estrutural e paisagística que lhe devolveu o antigo glamour, voltando a ser ponto de encontro das famílias de São Paulo  e, pela sua própria  envergadura, local ideal para a realização de grandes eventos culturais.

Ilha de verde exuberante dentro da cidade, com várias nascentes que lhe conferem encanto singular,  sua recuperação trouxe de volta grande variedade de pássaros que, ao lado de suas novas instalações (Espaço Biológico, Ranário, Meliponário, Espaço Leitura, Oficinas Culturais, Aquário) tornaram-se atração extra para os seus mais de quatro mil visitantes diários (chegando a quinze mil finais de semana).

 

Oração pela Paz

Nesta caminhada em busca de entendimento e respeito, o coletivo religioso que se congrega em torno da URI/SP, elegeu a Oração de Francisco de Assis como a prece de comunhão, a que melhor expressa os anseios de todos.

Senhor,

Faze de mim um instrumento de tua Paz!

Onde houver ódio, que eu leve amor;

onde houver ofensa, que eu leve perdão;

onde houver erro, que eu leve a verdade;

onde houver desespero, que eu leve esperança;

onde houver tristeza, que eu leve alegria;

onde houver trevas, que eu leve luz.

Ó, Divino Mestre,

Faze que eu procure antes

consolar que ser consolado;

compreender que ser compreendido;

amar que ser amado.

Pois é dando, que se recebe;

é perdoando, que se é perdoado;

é morrendo que ressuscitamos para a vida eterna.

Francisco de Assis

Poesia e a compreensão da Paz

Dedicatória Parte V

Wladímir Mayakovski- 1818

Talvez

Não sobre ao tempo- camaleão

Mais nenhuma cor.

Ainda um estertor

e tombará rígido, sem alento.

Talvez,

Bêbada de fumos e combates

A terra jamais levante a cabeça.

Talvez…Não!

Não pode ser!

Mais dia menos dia

O pantanal dos pensamentos se fará cristal.

Mais cedo ou mais tarde

a terra verá a púrpura que esguicha dos corpos.

Acima dos cabelos eriçados de espanto

torcerá os braços, gemendo:

“Meu Deus , que fiz eu!”

Não, não pode ser!

Peito,

guarda-te da avalanche do desespero,

a felicidade futura tateia e apalpa.

Quereis?

De meu olho direito tirarei

Todo um bosque em flor!

Sonhos,

multiplicai vossos pássaros prodigiosos!

Cabeça,

transborda de entusiasmo e orgulho!

Cérebro meu,

construtor sábio e alegre,

põe-te a reconstruir cidades!

Àqueles cujos dentes ainda rangem de cólera,

venho com a aurora de meus olhos luminosos.

Terra,

levanta teus milhares de Lázaros

e endominga-os

com alvas togas lunares!

O Cacto

                            This is cactus land.

                                                                Here the stone images

are raised …

Vamos, todos, brincar de cacto

Na areia da nossa tristeza.

Uma folha sobre outra,

Em caminho do céu intacto.

Uns nos ombros dos outros,

Um abraço a nascer de outro braço,

Uma folha sobre outra,

Formaremos um grande cacto.

……………………………………….

Filhos da pedra e do pó,

fique aqui embaixo o nosso orgulho,

pisado sobre o pedregulho.

Formaremos, num copo só,

( uma folha sobre outra

uma folha sobre outra,

um braço a nascer de outro braço )

a nossa escada de Jacó.

Pra que torre de Babel

ou o Empire State, compacto,

se, uns nos ombros dos outros,

chegaremos ao céu, num cacto ?

Uma folha sobre outra

E já uma árvore de feridas

por entre os anjos de azulejo

e as borboletas repetidas.

Que fique aqui embaixo a terra;

lá de cima tiraremos

uma grande fotografia

do seu rosto de ouro e prata.

Pra provar a Deus que a terra,

numa fotografia exata,

não é redonda, mas chata;

não é redonda, mas chata.

………………………………………………….

Que outros usem avião a jato

pra uma viagem em linha reta :

nós filhos da planície abjeta,

subiremos ao céu num cacto.

Uns nos ombros dos outros,

Injustiças sobre injustiças,

Formaremos um verde pacto…

Vamos, todos, brincar de cacto.

Vamos, todos, brincar de cacto.

( Ar. V )

Gog  & Magog

Cassiano Ricardo

Vou passar a fronteira

entre oeste e leste mas o monstro

                              ( de vidro )

invisível, impede o irmão

de ir abraçar o irmão sob o ar-

                                   co-íris.

2

Magog pergunta a Gog :

por que, no teu laboratório

                  feérico

                     hemisférico

não paras de fabricar abismos ?

Gog responde : se quiseres

que eu pare, pára tu primeiro.

Então serei teu companheiro.

Mas por mais que Magog interrogue

A Gog e Gog interrogue a Magog

algo os impede

de mútua confiança, de esperança.

É que o monstro de vidro

Lhes suprime a opção entre antes

e depois, e se coloca,

irremovível, entre os dois.

…………………………………………………………. 

Quando tudo for pedra…

Quando tudo for pedra…
atire a primeira flor
Quando tudo parecer caminhar errado,
seja você a tentar o primeiro passo certo.

Se tudo parecer escuro, se nada puder ser visto,
acenda você a primeira luz.
Traga para a treva a sua pequena lâmpada.

Quando todos estiverem chorando,
tente você o primeiro sorriso.
Talvez não na forma de lábios sorridentes,
mas na de um coração que compreenda,
de braços que confortem.

Se a vida inteira for um imenso não,
estabeleça a busca do primeiro sim,
ao qual tudo de positivo deverá seguir-se.

Quando ninguém souber coisa alguma,
e você souber um pouquinho.
Seja o primeiro a compartilhar aquilo que aprendeu
demonstrando o ensinamento em si mesmo.

Quando alguém estiver angustiado,
procurando e nem sabendo o que.
Perceba bem o que se passa,
talvez seja em busca de você mesmo que este seu irmão esteja.
Você tem algo único para passar a ele,
você pode ser o primeiro a aparecer, a mostrar, a resgatar,
você pode ser o último.

Quando a terra estiver seca,
que sua mão seja a primeira a regá-la.
Quando a flor se sufocar na urze e no espinho,
que seu cuidado seja o primeiro a separá-la,
a arrancar a praga,
a afagar as pétalas e a sentir seu perfume.

Se a porta estiver fechada,
que de você venha a primeira chave.

Se o vento sopra frio,
que o calor de sua lareira
seja a primeira proteção e primeiro abrigo.
Se o pão for apenas massa e não estiver cozido,
seja você o primeiro forno para transformá-lo em alimento.

Não atire a primeira pedra em quem erra,
de acusadores o mundo está cheio.
Nem por outro lado, aplauda o erro,
dentro em pouco a ovação será ensurdecedora.

Ofereça sua mão primeiro para levantar quem caiu.
Sua atenção primeiro para aquele que foi esquecido,
seja você o primeiro para aquele que não tem ninguém.

Quando tudo for espinho,
crie a primeira facilidade,
seja o primeiro a mostrar que há caminho de volta.
Demonstrando que o perdão regenera,
que o auxílio possibilita,
que a compreensão liberta
e que o amor edifica.

Atire você, quando tudo for pedra,
a primeira e decisiva flor…

A outra visão de João – O Evangelista.

Levado fui diante do trono,

absorvido

de albatroz energia.

E empurrado fui,

lá onde o sonho

trabalhava o dia.

Entrava pela correnteza

de luz e mel. E uma voz

ouvia: “Por miséricórdia

vivo permaneces”.

Tinha a percepção

de um completo reino,

com flores novas.

As almas eram

claridade exata.

E consumido,

com a luz ondeava,

sem o peso do eu.

Éramos todos

um só que nos

amava.

Demorei em voltar à tona.

Não queria. Escutava

meu outro nome,

o que está

em Deus, o nome

resoluto, perfeito.

Era forma do amor

que eu assumia.

NEJAR, Carlos – Os Viventes – Ed. Record – RJ – SP – 1999.

02 de março de 2004
From: “Lia – Palas Athena”

To: Subject: En: Reuniões na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo

Date: Fri, 26 Oct 2001 18:14:19 -0200

Mui prezados todos, 

Ontem foi realizada, no Auditório Franco Montoro da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, a Mesa Redonda “Reflexões Sobre a Paz Ativa – Ponte entre a Sociedade Civil e a Organização das Nações Unidas”, em comemoração à Semana Internacional do Desarmamento, e congraçamento pelo Prêmio Nobel da Paz outorgado recentemente à Kofi Annan e à própria ONU.

 No encerramento da Mesa Redonda foi lida a carta “Vigília Cívica pela Cultura da Paz”, que recebeu a adesão de 44 organizações cujos representantes estavam presentes. Em anexo encontra-se a carta e a relação das organizações que a subscreveram. Àquelas entidades que desejarem aderir a esta iniciativa, solicitamos nos enviem o nome completo, tanto da entidade quanto da pessoa que assina a adesão.

Informamos ainda que na reunião do dia 18 de outubro foi entregue em plenário o ofício dirigido ao Presidente da Assembléia Legislativa requerendo a criação urgente do Conselho Estadual Pela Paz, assinado por 26 instituições. Tendo recebido uma entusiasmada acolhida pelas autoridades e público presentes, foi marcada uma próxima reunião de trabalhos, destinada a definir as ações prioritárias do Conselho, que será na quinta-feira, 8 de novembro, às 19 horas, no Auditório Teotônio Villela, da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

Para seu conhecimento, anexamos também o texto do referido requerimento.

Ficando ao seu dispor para quaisquer informações adicionais que forem necessárias, expressamos nossos cumprimentos mais fraternos,

Lia Diskin

p/ Comitê Paulista para a Década da Cultura de Paz – um programa da UNESCO

Vigília Cívica pela Cultura da Paz

O povo brasileiro – através de suas instituições e leis – sustenta que as relações internacionais devem fundamentar-se no respeito à independência e soberania nacionais e na solução pacífica das controvérsias, conseqüentemente condenamos todo e qualquer tipo de violência, quer seja praticada por indivíduos ou Estados, contra a vida ou a dignidade humanas.

Esses princípios estão explicitamente enunciados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil, que sintetiza os anseios por liberdade, igualdade, justiça e paz de toda a humanidade. Refletem também a tradição de convivência entre diferentes do povo brasileiro, que se solidariza com as vítimas da violência, tanto nos Estados Unidos quanto no Afeganistão, ou em qualquer outro lugar onde se manifeste.

A Constituição Federal do Brasil de 1988 – a Constituição Cidadã – da qual o atual Presidente

da República é um dos signatários, sabiamente acolhe todos esses princípios. Estamos certos que a representação brasileira saberá, na abertura da Assembléia Geral das Nações Unidas, em nome do povo, defender todos esses conceitos consagrados em nossa Constituição.

A crise atual, com violações flagrantes do princípio da convivência entre os povos, aterroriza a humanidade com o espectro de uma guerra de dimensões e conseqüências imprevisíveis.

Diante desses fatos, as instituições e personalidades que subscrevem este documento convocam toda a sociedade para uma Vigília Cívica pela Cultura da Paz em defesa dos seguintes pontos:

1º) Que o Brasil, na Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (14/11/2001), defenda a imediata suspensão das hostilidades EUA / Afeganistão.

2º) O fortalecimento do foro multinacional das Nações Unidas para que possa exercer de forma plena e plural a responsabilidade na solução pacífica das controvérsias.

3º) O encaminhamento para um Tribunal Penal Internacional de todos os que cometam crimes contra a humanidade.

4º) Criar Conselhos Pela Paz no âmbito Municipal, Estadual e Federal, nos moldes dos Conselhos já existentes, com a missão de promover uma Educação e Cultura para a Paz.

A humanidade anseia por viver em um mundo em paz. Sabemos, no entanto, que a paz só é possível num mundo plural, sem hegemonias, solidário, preocupado com o pleno desenvolvimento responsável da comunidade humana nos aspectos econômico, cultural, espiritual, político e social e em harmonia com a natureza.

São Paulo, 10 de Setembro 2003

Prezada Mestra Lia,

Irmã no fazer o bem.

Boa noite!

Estou encaminhado, como de costume, para suas avaliações, um ligeiro lastro do movimento que desencadeamos, inicialmente sob o nome de Bandeira da Paz, e ora A Paz é o Caminho…, agrupando outras ações afins.

Assim que possível prepararei para o Comitê Paulista da Década de Cultura de Paz um relatório dos vários “plantios” de nossas bandeiras, ressaltando-se desde já a importância e os resultados das ações em São José dos Campos/Vale do Paraíba e, mais recentemente no Memorial da América Latina.

O fato da Abaçaí ser um braço operante do movimento, juntando-se às azáfamas do Revelando São Paulo e os compromissos com o meu Doutorado, têm limitado bastante minha capacidade de dedicação a outras importantes: Somos os mesmos valiosos e amorosos cidadãos planetários que nos encontramos envolvidos com outras ações de amor e dedicação ao bem comum.

Solicito que encaminhe estas considerações aos nossos guardiães primeiros da Bandeira da Paz, os membros do CONPAZ, do Comitê Paulista para a Década de Cultura de Paz, e outros interessados,com as seguintes considerações:

– Nós, da Abaçaí, nos comprometemos a continuar sendo um braço operante do A Paz é o Caminho…

– Tendo em vista o crescimento das ações e sua disseminação, acreditamos ser útil a formação de um pequeno grupo de gerenciamento, que, com suas interlocuções, ajudará a pensar e avaliar as ações propostas;

– A formalização de compromisso dos guardiães, garantindo confiabilidade a toda a rede da Bandeira da Paz/Cultura de Paz.

Acredito que assim poderemos fazer mais e melhor.

Sempre pronto ao trabalho e com o coração sempre aberto,

Toninho Macedo

10/10/2003 19:05
Assunto: Texto em nome do Comitê Paulista

Querido Toninho,

Obrigada pela sua mensagem de 10 de outubro, que me proporcionou grande alegria. Vamos continuar remando!

Aqui vai o texto em nome do Comitê.

Beijos e belíssimo plantio para todos vocês!

Reafirmando Compromissos

Todo gesto, toda palavra, carrega em si possibilidades de mobilizar conseqüências. Elas serão duradouras e profundas na medida em que investamos tempo e cuidados para orientá-las na direção que lhes deu origem. Se essa origem é a promoção da Paz, nossos esforços terão de ser redobrados, pois é necessário um exercício diário de auto-educação para harmonizar as aspirações individuais com os compromissos sociais. Identidade e comunidade alimentam-se mutuamente, criando um eco-sistema de referências que, quando orientados para o bem-comum, potencializam o melhor de ambos gerando renovação e saúde social.

 O plantio de bandeiras da Paz é um gesto que busca reafirmar o compromisso que estabelecemos conosco e com os que nos rodeiam para criar condições de vida mais solidárias e generosas, alinhadas com valores universais e inclusivos, capazes de nos fazer sentir irmãos de uma única família, habitantes de uma única terra, membros de uma humanidade que tem um destino comum: tecer no tempo o mistério da eternidade.

Lia Diskin

p/ Comitê Paulista para a Década da Cultura de Paz

– um programa da UNESCO

Afoxé Filhos de Gandhi do Rio de Janeiro

( Para os cortejos e caminhadas pela vida e pela Paz)

Eu trago!

Eu trago o Axé na rua

O azul e branco da Paz

Cante comigo, meu povo

O Gandhi é lindo demais

Quem vem lá da Senzala

Segue o Gandhi, auê!

Auê! Salve o Gandhi, auê!

9–Fale Conosco

Abaçaí Cultura e Arte

Parábolas para uma Cultura de Paz

Caderno da Cultura de Paz

Abaçaí Cultura e Arte

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Toninho Macedo- Abaçaí Cultura e Arte – Março 2004