Artesanado de Palha de milho, da cidade de Redenção da Serra. Artesã Giselda. Fotografia de Reinaldo Meneguim

Samba de Bumbo

Para o samba de bumbo (também conhecido como samba rural) é uma variantes do samba tradicional em São Paulo, considerado como ancestral do samba cosmopolita. Guarda traços que o aproxima do jongo e do batuque, seus parentes próximos e por muitos considera-os como seu antecessor. Tem como foco de aglutinação a Festa do Bom Jesus, em Pirapora. Letras e melodias singelas e funcionais, algumas tradicionais, outras estruturadas de acordo com as circunstâncias.

Samba de Bumbo (Campinas e Pirapora)

O Samba de bumbo e a Festa de Agosto

Pirapora, como já afirmado anteriormente, é reconhecida como tendo sido um dos redutos do samba em São Paulo (ao lado de Campinas, Santana do Parnaíba, Brás, Bixiga e Casa Verde- na capital, e Mauá- na Grande São Paulo).

A este samba Mário de Andrade chamou samba rural, e Rossini, mais argutamente, chamou samba de bumbo, o tambor, neste caso um grande bumbo, sendo reconhecido como centro, como referência da dança.

Assim Mário a ele se referiu:

O grupo, formado de indivíduos de ambos os sexos, tem seus instrumentos. Instrumentos sistematicamente de percussão, em que o bumbo domina visivelmente. A sua colocação sempre central na fila dos instrumentistas bem como por ser da decisão dele o início de cada dança (além do seu valor financeiro) lhe indicam francamente a primazia entre os instrumentos. Primazia que se estende ao seu tocador. As mulheres nunca tocam. Os homens, pelo contrário, todos tocam, e indiferentemente qualquer dos instrumentos passando estes de mão em mão.

Pela confluência que se dava em Pirapora, ficou conhecido também como Samba de Pirapora. Se a confluência se dava pelo Santuário do Bom Jesus – Casa Verde. Entretanto o maior contingente de romeiros sambadores era proveniente de Campinas, o maior reduto do mesmo.

A cada ano, sem anúncios, como já foi dito anteriormente, os sambadores e sambadeiras tinham encontro espontâneo, aninhando-se nas proximidades do Santuário.

Retornemos ao Mário:

Enfileirados os instrumentistas, com o bumbo ao centro, todos se aglomeram em torno deste, o geral inclinados pra frente como que escutando uma consulta feita em segredo. Isto faz parte sistematizada do samba, e também existe no jongo, pelo que vi nas proximidades de São Luiz do Paraitinga. É pois a coletividade que decide do texto-melodia com que vai sambar. No grupo em consulta, um solista propõe um texto-melodia. Não há rito especial nesta proposta. O solista canta, canta no geral bastante incerto, improvisando. O seu canto, na infinita maioria das vezes, é uma quadra ou um dístico. O coro responde. O solista canta de novo. O coro torna a responder. E assim, aos poucos, desta dialogação, vai se fixando um texto-melodia qualquer. O bumbo está bem atento. Quando percebe que a coisa pegou e o grupo, memorizando com facilidade o que lhe propôs o solista, responde unânime e com entusiasmo, dá uma batida forte e entra no ritmo em que estão cantando. Imediatamente à batida mandona do bumbo, os outros instrumentos começam tocando também, e a dança principia.

A posteriori, Edison Carneiro, escudado no próprio Mario e no Rossini, apresenta sua descrição:

– Samba rural. Os participantes dispõem-se em filas vis-à-vis, os instrumentistas (homens) de um lado, as mulheres (dançarinas) do outro. Mário de Andrade, que observou este tipo de dança em Pirapora, escreveu:

Assim que os instrumentistas principiam tocando, avançam em fila para a frente. As filas
de dançantes que os defrontam recuam. Depois são estas que avançam enquanto os instrumentistas recuam [ … ] O movimento geral é um avançar e recuar em filas.

A coreografia lhe pareceu precária: Incerto rebolar de ancas, nenhuma virtuosidade com os pés, nunca vi a umbigada tradicional …

Pessoalmente tive oportunidade de acompanhar o samba na festa de agosto (do Bom Jesus), numa das últimas vezes em que o núcleo campineiro se fez presente (1981). Para estes encontros acorriam sambadores de vários cantos, até mesmo da capital, sempre em sintonia com o referido núcleo. No ônibus em que segui para Pirapora, saindo, então, de perto da estação da Luz, seguiram outras pessoas da região da Casa Verde.

A este momento o núcleo piraporense estava bastante combalido, e não conseguia se fazer notar enquanto tal. Agregavam-se, enquanto indivíduos, ao grupamento identificado como campineiro.

É de se notar ainda que, naquele momento, a Prefeitura local, por ocasião da festa, instalava um serviço de som, com cornetas espalhadas pelos postes, difundindo músicas midiáticas, o que simplesmente impedia a reunião dos sambadores em local mais central. Uma chácara localizada à entrada da cidade ficou sendo seu local de resistência. Por vezes irradiavam para a rua fronteiriça.

Este foi, a meu ver, o maior golpe dado no Samba de Bumbo de Pirapora.

As fotos que se seguem (bem como as da procissão fluvial no Tietê) foram feitas naquela ocasião. Tendo se deteriorado pela ação do tempo foram tratadas para que não se perdesse um documental raro. Naquela oportunidade pude constatar seu funcionamento conservando os mesmos traços observados e descritos pelos pesquisadores citados anteriormente.

As fotos que se seguem foram por mim realizadas em 1980.

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Nos momentos em que o samba se espraiva pelas adjacências da chácara reduto, adensava-se o número de interessados, restringindo-se seu espaço de ação e o leva e tras do mesmo. Em destaque o grande bumbo, figura central do samba.

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Dona Elza, a sambadeira

Dona de um vozeirão, de personalidade marcante, pertencia ao núcleo de Campinas.

Dominava o espaço do samba, quando estava presente. Gostava de demandar, usando sempre os versos adequados tanto para responder a provocações, quanto para provocar.

Teve olhares interessados por alguém que achegou-se à roda. Outras também. Saiu na dianteira:

Eu plantei o roxo n’ água

De azul na veradinha.

Quem quiser que colha o roxo, mano

Que o azul é planta minha.

Pronto: Recado dado.

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Na mesma ocasião, Maria Ester e alguns remanescentes do “samba local”, então desagregado, reuniam-se paralelamente.

Maria Ester em 1981

Samba de D. Aurora (Vinhedo)

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O Samba de D. Aurora, em Vinhedo, homenageia a benzedeira Aurora Sudário (falecida em 9 de dezembro de 1997, aos 106 anos de idade), é parte significativa do universo do samba de bumbo, ocorrente no médio Tietê. Em 2009, a Comissão Paulista de Folclore, in memoriam, a reconheceu como figura importante no âmbito do Patrimônio da Cultura Imaterial em São Paulo, e desde então reconhecida oficialmente como patrimônio imaterial de Vinhedo. É reconhecida como benzedeira afamada: começou fazer atendimentos espirituais, acolhendo pessoas com problemas de saúde e espirituais desde seus 29 anos, demonstrando, segundo consta muita sabedoria em toda sua conduta na vida, promovendo o bem estar das pessoas em todas as suas ações.

Samba de Quadra

Quadra é pequeno município emancipado de Tatuí, a 150 kms da Capital, com cerca de três mil habitantes. Ali encontramos, hoje, uma vertente de nosso samba conhecido como samba de Quadra, samba caipira, samba do mato, samba matuto.

Não se conseguiu até o presente deslindar sua origem tida como centenária. Guardamos, assim, o depoimento de João do Ditão (João José Andrade), à frente do grupo de sambeiros e cantadores (estes os músicos), que afirma ter aprendido com seu pai Ditão, que por sua vez aprendeu com o avô, que aprendeu com o bisavô, que teria aprendido com os escravos. A mesma trajetória dos demais grupos.

Assim estruturados em grupo, batizado de Os Filhos da Quadra, funcionam desde 1964. Pelo mesmo passaram vários integrantes (mais de 50 pelos cálculos de João), até que se tornaram visíveis.

Quadra: A morada do samba caipira - Adriano Ávila

O instrumental, todo de percussão, de confecção artesanal, compõe-se de bumbos, geralmente dois, por eles chamados de caixas, pandeiros e reco-recos. Foi o próprio João, carpinteiro de ofício, quem os confeccionou (os instrumentos que vêm de fábrica saem fora do padrão, acredita).

Chicão: João de Ditão, Zé do Abel e Preto - Adriano Ávila

De peculiar em seu instrumental, consta um pandeirão, na realidade um grande adufe, de couro de bode, que, segundo Ditão, foi feito por seu pai, há mais de 60 anos. Fato inusitado no universo da cultura tradicional em São Paulo.

Chicão: João de Ditão, Zé do Abel e Preto . Foto: Adriano Ávila

https://www.redebrasilatual.com.br/revistas/101/o-samba-caipira-resiste-em-quadra-no-interior-de-sao-paulo-9193.html

Os versos, simples e espontâneos, são cantados como toadas. Entretanto seu sotaque inconfundível, característico da região, (eles nasceram e sempre moraram em Quadra), é um desafio aos ouvidos e à compreensão daqueles que não estão habituados ao mesmo: à primeira escutada, é quase incompreensível.

O grupo aproveita o melhor da vida rural, a calmaria dos sítios, e mesmo na cidade de Quadra, para motivarem seus encontros: é esta forma ainda meio ingênua de levar a vida no mato que os inspira em suas letras e modas. Inspira bons causos com muita alegria, renovada e intensificada nos encontros a cada final de semana na casa de João do Ditão.

Sobre esta expressão foi rodado um filme Samba de Quadra – o samba que veio do mato, que deu novo alento ao grupo, a ponto de alguns mais novos começarem a se interessar. O que sempre acontece quando estas expressões são tiradas da sombra.

Ocorrência: Campinas, Piracibaca, Rio Claro, Pirapora, Santana de Parnaíba.

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